Os elementos xenônio e ouro tem ambos estruturas no estado sólido que consistem em arranjos de empacotamentos densos cúbicos de átomos. Mesmo assim, Xe se a -112^{\circ} \mathrm{C} e o ouro se funde a 1064^{\circ} \mathrm{C}. Esclareça essa enorme diferença nos pontos de fusão.

Passo 1

O enunciado diz que os elementos xenônio e ouro têm, no estado sólido, arranjos de empacotamento cúbico denso (ou seja, ambos formam estruturas compactas). Ele fornece dois pontos de fusão:
\,-112^\circ\mathrm{C} para xenônio e \,1064^\circ\mathrm{C} para ouro.
A pergunta é: justificar/explicar por que há essa enorme diferença entre os pontos de fusão, apesar de ambos terem empacotamentos densos.

Passo 2

O que significa um ponto de fusão em termos físicos (ideia-chave).
  • O ponto de fusão é a temperatura na qual a energia térmica disponível vence, em média, as forças que mantêm os átomos/moléculas presos na rede sólida.
  • Portanto, quanto mais fortes forem as forças que prendem as partículas na rede, maior será a energia térmica necessária para “quebrar” a ordem e fundir o sólido, logo maior o ponto de fusão.
    Isso significa que precisamos comparar a força de coesão (energia que mantém as partículas juntas) em cada sólido.

Passo 3

Identificar que tipo de interação mantém unidos os átomos em cada caso (isso é crucial).
  • Xenônio sólido: cada átomo de xenônio é um átomo nobre com camadas eletrônicas preenchidas; não forma ligações covalentes ou iônicas. Os átomos neutros atraem-se por forças de dispersão de London (forças de van der Waals) — interações fracas e de curto alcance causadas por dipolos instantâneos e induzidos.
  • Ouro sólido: átomos de ouro formam ligações metálicas — há elétrons (principalmente elétrons de valência) deslocalizados que se movem pelo cristal e ligam fortemente os átomos positivos da rede. Em metais nobres como o ouro, além disso, orbitais d também contribuem para a coesão, tornando a ligação metálica forte.
    Observação importante: o fato de as estruturas serem geometricamente semelhantes (empacotamento denso) não garante que a intensidade das interações entre partículas seja a mesma — geometria ≠ força de ligação.

Passo 4

Explicar, de modo didático, o que são forças de dispersão (London) e por que são fracas para o xenônio.
  • Forças de dispersão aparecem quando variações momentâneas na distribuição eletrônica criam dipolos temporários que induzem dipolos em átomos vizinhos; a energia dessas interações escala com a “polarizabilidade” do átomo e decai rapidamente com a distância (aproximadamente com 1/R^6).
  • A polarizabilidade cresce com o número de elétrons e com o tamanho do átomo, logo xenônio (um gás nobre pesado) tem maior polarizabilidade do que gases leves — isso faz com que xeônio sólido tenha ponto de fusão bem maior que, por exemplo, neônio. Ainda assim, mesmo sendo o mais polarizável entre os gases nobres está preso por forças relativamente fracas quando comparadas às ligações químicas ou metálicas.
  • Conclusão: xenônio permanece unido por interações fracas; por isso se funde a uma temperatura muito baixa.

Passo 5

Explicar, de modo didático, o que é ligação metálica e por que é forte no ouro.
  • Em um metal, os elétrons de valência ficam parcialmente deslocalizados sobre todo o cristal, formando uma “nuvem” eletrônica que liga os núcleos positivos entre si. Essa deslocalização produz uma energia de coesão grande (muita energia é necessária para separar átomos do metal).
  • No caso do ouro, a contribuição dos elétrons d (orbitais d quase preenchidos) e efeitos que reforçam a atração eletrônica tornam a coesão ainda mais significativa. Além disso, efeitos relativísticos (por serem elétrons de níveis internos rápidos em elementos pesados) alteram levemente os orbitais e reforçam certas caracteristicas do Au — isto é um detalhe que aumenta a força de ligação em comparação com metais mais leves.
  • Conclusão: ouro tem ligações metálicas fortes, o que dá um ponto de fusão elevado.

Passo 6

Fazer uma comparação quantitativa sem complicar: energia térmica disponível é da ordem de k_BT. Vou estimar essa energia nas temperaturas de fusão para dar uma noção da diferença de energia envolvida.
  • Primeiro converto temperaturas para Kelvin:
    \,-112^\circ\mathrm{C} = 161\\ \mathrm{K} (pois 161 = -112 + 273).
    \,1064^\circ\mathrm{C} = 1337\\ \mathrm{K} (pois 1337 = 1064 + 273).
  • A constante de Boltzmann é \,k_B \approx 8{,}617\times 10^{-5}\\ \mathrm{eV/K}.
  • Energia térmica típica por partícula é \,k_BT. Calculo aproximado para cada caso: k_B T_{\text{Xe}} \approx 8{,}617\times 10^{-5}\times 161 \approx 0{,}0139\\ \mathrm{eV},
k_B T_{\text{Au}} \approx 8{,}617\times 10^{-5}\times 1337 \approx 0{,}115\\ \mathrm{eV}.
  • A razão entre essas energias é aproximadamente 0{,}115/0{,}0139 \approx 8{,}3.
    Interpretação: a energia térmica necessária para fundir o ouro é, em ordem de grandeza, várias vezes maior que a necessária para fundir o xenônio — ou seja, as forças de coesão por átomo no ouro são muito maiores.

Passo 7

Conectar a comparação numérica com os tipos de interação:
  • As forças de dispersão que mantêm Xe sólido têm energia por átomo da ordem de algumas centésimas de eV (como o cálculo acima sugere para k_BT em 161\\ \mathrm{K}).
  • As ligações metálicas no ouro implicam energias de coesão por átomo muito maiores (da ordem de décimos de eV por átomo ou maiores), coerente com o k_BT na faixa de 1337\\ \mathrm{K}.
  • Portanto, não é surpresa que o ouro precise de muito mais energia térmica para romper a ordem cristalina e fundir-se: as forças que o mantêm sólido são muito mais fortes que as de um sólido formado por átomos nobres como o xenônio.

Passo 8

Dar exemplos e intuição adicional para fixar:
  • Compare com outros gases nobres: argônio funde a \,-189^\circ\mathrm{C}, neônio muito abaixo disso — isso mostra que sólidos de gases nobres sempre têm pontos de fusão muito baixos por dependerem apenas de forças de dispersão.
  • Compare com outros metais: cobre e prata têm pontos de fusão próximos de 1000^\circ\mathrm{C}, mostrando que metais com ligações metálicas fortes tipicamente possuem pontos de fusão altos.
  • Moral: empacotamento geométrico (fcc, hcp) determina apenas “como” os átomos estão arrumados, mas o ponto de fusão depende primordialmente de “quanto” esses átomos se atraem — isto é, do tipo e intensidade das interações entre eles.

Passo 9

Resumo final didático e encorajador (curto):
  • Xenônio: ligações fracas (forças de dispersão), baixa energia de coesão por átomo → ponto de fusão muito baixo ( -112^\circ\mathrm{C}).
  • Ouro: ligações metálicas fortes (elétrons deslocalizados e contribuição de elétrons d, com efeitos relativísticos reforçando) → alta energia de coesão por átomo → ponto de fusão muito alto ( 1064^\circ\mathrm{C}).
    Se você entender que ponto de fusão mede quanta energia térmica precisa superar a energia de coesão, a diferença deixa de ser surpreendente: são tipos de ligação completamente diferentes.

Resposta

Xenônio: forças de coesão fracas (forças de dispersão de London entre átomos nobres) ⇒ baixa energia de ligação por átomo ⇒ ponto de fusão baixo ( -112^\circ\mathrm{C}).
Ouro: ligações metálicas fortes (elétrons deslocalizados, contribuição de orbitais d e efeitos relativísticos) ⇒ alta energia de ligação por átomo ⇒ ponto de fusão alto ( 1064^\circ\mathrm{C}).

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