Teoria Completa
O ciclo Diesel
O motor de um carro de fórmula 1 é igual ao motor de um ônibus? É claro que não né!
Mas será que o que muda é apenas o tamanho do motor ou todo o ciclo termodinâmico que muda de um para o outro?
A resposta é que todo o ciclo muda, enquanto carros de fórmula 1 utilizam o ciclo Otto, porque fornece alta potência e velocidade e é movido a gasolina. Veículos maiores utilizam o ciclo Diesel que tem um torque muito maior (para mover cargas pesadas) e que utilizam o Diesel, como combustível, olha que coincidência kkk.
Assim como o ciclo Otto, o ciclo Diesel é um ciclo utilizado em motores de combustão interna, porém, não utiliza uma centelha para iniciar a combustão. Ao invés da centelha, a combustão ocorre quando o combustível entra no cilindro pressurizado o que causa a autocombustão devido à alta pressão. Assim como o ciclo Otto dizemos que o fluido de trabalho é o ar e tem o seguinte funcionamento:
- 1 – 2: O pistão sobe comprimindo o ar existente no cilindro numa compressão isentrópica (lembrando que um processo isentrópico é um processo adiabático reversível onde não há troca de calor e a entropia se conserva).
- 2 – 3: Transferência de calor para o ar num processo isobárico (no ciclo ideal ocorre a transferência de calor para o ar a partir do nada, vai entender né!? Mas no ciclo real o calor vem da combustão).
- 3 – 4: O pistão desce fazendo com que o ar se expanda num processo de expansão isentrópica.
- 4 – 1: Rejeição de calor a volume constante, ou seja, um processo isovolumétrico.
Obs: Os pontos Vpms e Vpmi representam o volume do ponto morto superior, quando o pistão se encontra no ponto mais alto, e o volume do ponto morto inferior, quando o pistão se encontra no ponto mais baixo, respectivamente. V3 é o volume do cilindro após a transferência de calor, ou seja, após a combustão.
Para lembrar do ciclo Diesel é só ver que o processo 2 – 3 é uma isobárica, ao invés de uma isovolumétrica (como é o ciclo Otto). Então são duas isentrópicas, uma isobárica e uma isovolumétrica.
Eficiência
A eficiência do ciclo Diesel é calculada como qualquer outra eficiência de uma máquina térmica.
Como, pela primeira lei:
Vamos ter que a eficiência pode ser escrita da forma:
Até aqui tudo igualzinho ao ciclo Otto, mas como temos umas isobárica no processo de absorção de calor vamos trocar por . Ou seja O ciclo recebe calor (processo 2 – 3) numa isobárica e rejeita calor (processo 4 – 1) numa isovolumétrica.
Se liga em como esses processos acontecem na prática: O processo 2 – 3 é isobárico porque a combustão acontece de forma lenta, enquanto o pistão se move ele vai “ajustando” a pressão de forma a mante-la constante.
Já o processo 4 – 1 é isovolumétrico porque ocorre de maneira muito rápida e assim que a válvula de escapamento se abre o vapor da combustão é expelido e a pressão e temperatura caem sem variação do volume (porque o vapor sai muito mais rápido do que a velocidade de descida e subida do pistão).
Como o calor trocado durante uma isovolumétrica é calculado da forma , e na isobárica como então podemos escrever a eficiência assim:
A relação de é igual a logo
Isso aí de cima, após algumas continhas, é uma das partes mais importantes desse assunto que é a equação da eficiência e é igual a
Onde é a chamada razão de compressão e é definida como , que também é igual a . E é a chamada razão de corte que é igual a razão .
Vamos explicar de onde essa equação veio.
Relações de temperatura e volume
Voltando aos cálculos vamos reorganizar isso:
colocando em evidência em cima e em evidência embaixo.
No capítulo sobre ciclo de Brayton fizemos algumas contas com as relações isentrópicas, obtendo:
Lembra que o é a constante, e no caso do ar que é o mais comum vale
E do capítulo do ciclo de Otto temos:
Podemos juntar as duas relações e achar o seguinte:
Essa relação é importante pra cacete ok!! Você não precisa lembrar desse desenvolvimento todo, se lembrar daquela equação da eficiência e dessa relação aí de cima ta ótimo!!!
Continuando, para aplicar isso na equação da eficiência devemos conhecer as relações de temperaturas. No processo isobárico podemos utilizar:
Como é igual a temos:
Agora vamos fazer as seguintes relações:
E como
Logo
Daí temos que
Para achar
Podemos substituir na equação da eficiência
Lembrando que
Então no fim das contas o que você tem que lembrar mesmo são essas duas:
Eficiência
Relação de isentrópicas
Relação de compressão e eficiência
Comparando com o ciclo de Otto vamos perceber que, para uma mesma taxa de compressão, o ciclo de Otto é sempre mais eficiente do que o Diesel. Então por que bulhufas estudamos o ciclo Diesel?
A resposta é simples, o ciclo Diesel consegue trabalhar com compressões da ordem de 15:1 até 25:1 o que seria demais para o ciclo Otto, que varia de 8:1 até 12:1, assim, uma grande vantagem do ciclo Diesel é a maior eficiência que gera uma economia para as transportadoras e companhias de ônibus por exemplo.
O gráfico acima mostra como a eficiência aumenta com a taxa de compressão , reafirmando o fato do ciclo Diesel ser mais eficiente e consequentemente barato.
O ciclo Diesel consegue fazer isso porque ele utiliza o princípio da autocombustão a seu favor só injetando o combustível quando a pressão já ta lá nas alturas, enquanto no ciclo Otto a autocombustão é um empecilho porque a gasolina “explode” sozinha dentro do cilindro antes da pressão crítica.
Pressão média efetiva
A gente não acabou de falar que quanto maior a pressão maior a eficiência do ciclo? Pensando nisso, nossos incríveis engenheiros bolaram a ideia de uma pressão média efetiva que é calculada igualmente para ambos os ciclos (Otto e Diesel) da forma:
O legal de se saber a é que com ela a gente pode achar a força que um motor faz, se lembra que pressão é igual a força sobre a área?
Se a gente quer a força, podemos pegar substituir a pressão pela pressão média efetiva e a área pela área do cilindro:
Então se um carro tem e área do cilindro igual a 50 cm², a força que o ciclo realiza é de:
Exercício Resolvido #1
Abaixo estão representadas as fórmulas para cálculo das eficiências de um ciclo Otto e um ciclo Diesel. Observando as duas equações pode-se perceber que a eficiência de um ciclo Diesel é sempre menor do que a do Otto para uma mesma razão de compressão . Explique, então, porque o ciclo Diesel é considerado mais eficiente do que o ciclo Otto e porque é mais utilizado em veículos de grande porte.
Passo 1
Como (razão de corte) é igual a razão entre os pontos 3 e 2 (depois e antes do combustível ser injetado) então com isso a eficiência do ciclo Diesel realmente é menor do que a do ciclo Otto.
Porém, é crucial notar que isso é válido apenas para o caso de uma mesma razão de compressão . Como a razão de compressão do ciclo Diesel (15 até 25) é bem maior do que a do ciclo Otto (8 até 12) então no final das contas o ciclo Diesel é mais eficiente.
Passo 2
Pelo fato do ciclo Diesel ter uma combustão mais lenta do que o ciclo Otto, o ciclo Diesel terá um torque maior, fundamental para veículos de grande porte, enquanto o ciclo Otto terá uma potência maior, ideal para carros de corrida por exemplo.
Resposta
Exercício Resolvido #2
O cálculo da eficiência de um ciclo Diesel pode ser calculado conforme a equação abaixo:
Porém além disso, pode ser calculado como qualquer motor termodinâmico, ou seja, da forma:
Se fosse viável saber a temperatura de cada ponto desse ciclo descreva como ficaria essa relação em função das temperaturas.
Passo 1
Aqui o mais importante é lembrar que o ciclo Diesel recebe calor a pressão constante e perde calor a volume constante. Isso é importante porque o calor trocado a pressão constante é dado por:
E a volume constante é igual a
Ou seja,
Assim,
É claro que é muito difícil obter todas essas temperaturas, por isso é muito mais conveniente utilizar a relação de volumes.
Resposta
Exercício Resolvido #3
Um motor funciona segundo o ciclo Diesel e possui razão de compressão igual a 20, razão de corte igual a 3 e na primeira etapa de seu ciclo (compressão) a pressão é igual a 100 kPa e temperatura de 20°C. Calcule a temperatura ao final da compressão, a eficiência desse ciclo e a pressão efetiva média, sabendo que esse ciclo absorve um . Dado:
Passo 1
A temperatura ao final da compressão pode ser calculada pela relação isentrópica:
Passo 2
A eficiência do ciclo Diesel é definida como:
Portanto, a eficiência será igual a
Passo 3
A pressão efetiva média é dada por
Portanto, vamos precisar achar , e
Vamos achar primeiro o trabalho líquido que é dado por
Agora achamos os volumes por meio da equação de Clapeyron
Agora é só substituir
Resposta
Exercício Resolvido #4
Um motor ciclo Diesel ideal opera com uma razão de compressão de 20 usa ar como fluido de trabalho. O estado do ar no começo da compressão é de 95kPa e 20°C. Se a máxima temperatura do ciclo não deve exceder 2200K, determine a eficiência térmica
Considere que as propriedades são constantes à temperatura ambiente.
Dados: ; ; ;
Passo 1
Se a temperatura não deve exceder 2200K isso significa que então projetaremos o motor para tal. Se conseguirmos achar a razão de corte então nossa vida irá simplificar muito.
Primeiro vamos achar
Para achar temos de saber primeiro o volume que é dado pela relação dos gases perfeitos a pressão constante
Passo 2
Observe que essa relação é exatamente a razão de corte do motor. Então podemos substituir direto na equação da eficiência
Resposta
Exercício Resolvido #5
Considere um ciclo padrão a ar Diesel ideal, no qual o estado do ar, antes do processo de compressão, é 90 kPa e 290K e a relação de compressão é 20. Qual deve ser a máxima temperatura do ciclo para que o rendimento térmico seja igual a 60,6%? Dados:
Passo 1
Vamos olhar a equação da eficiência antes de começar a resolver o problema
Como já temos o fator de compressão basta e sabemos também que . Aí a gente lembra que a operação 2 – 3 é uma isobárica e, portanto, a relação
É válida
Passo 2
Então o que vamos fazer aqui é calcular o
Aqui vamos ter que chutar alguns valores de , lembrando é claro que não pode ser igual a 1. Portanto, se colocarmos temos:
A aproximação está bem próxima, portanto, vamos utiliza-la.
Passo 3
Agora vamos achar a temperatura por meio da relação das isentrópicas
Passo 4
Vamos achar pela relação da isobárica (proveniente da equação de Clapeyron)
Resposta
Exercício Resolvido #6
Um ciclo padrão a ar Diesel ideal, no qual o estado do ar, antes do processo de compressão, é 90 kPa e 290K e a relação de compressão é 20 e o fator de corte igual a 2,5. Calcule o calor frio trocado, o calor quente recebido, o trabalho líquido e a eficiência deste ciclo. Dados: . ;
Passo 1
Se acharmos a temperatura em cada um dos estados então será fácil achar os calores e trabalho porque os calores dependem da variação da temperatura e do fluido, no caso o ar. Então vamos achar a temperatura por meio da relação das isentrópicas
Passo 2
A temperatura nós vamos achar pela relação da isobárica, lembrando que
Passo 3
Agora vamos achar a temperatura novamente por meio da relação das isentrópicas
O probleminha aqui é a relação mas a gente sabe que e sabemos também que
Então
Assim,
Passo 4
Agora basta achar e .
Passo 5
Então é igual a
E a eficiência
Resposta
Exercício Resolvido #7
No início da compressão de um ciclo de ar-padrão Diesel, , e . A taxa de compressão é 15 e a temperatura máxima do ciclo é de 1400K. Determine. Dado: ; , .
a) A massa de ar, em kg.
b) A adição e a rejeição de calor por ciclo.
c) O trabalho líquido e a eficiência térmica.
Passo 1
Vamos calcular a massa de ar pela equação dos gases perfeitos na forma:
A massa aparece aqui porque estamos utilizando o volume absoluto (em m³) ao invés do volume específico (em m³/kg) e também por estarmos utilizando a constante relativa ao ar, que já considera a massa molecular desta susbtância. Portanto, a massa pode ser calculada como:
Passo 2
Para achar o calor quente (adição de calor) e o calor frio (rejeição) vamos utiliazar as equações para troca de calor em isobáricas (adição) e isovolumétricas (rejeição), isso para o caso do Diesel.
Repare que utilizamos maiúsculo quando a massa entra na equação, pois resultará na quantidade de calor de fato (ao invés da quantidade de calor pela massa).
Então vamos calcular as temperaturas em 2 e em 3 para substituir na fórmula. Como o processo 1 – 2 é uma isentrópica então
Da mesma forma para o processo 3 – 4