Qual a função da mistura \mathrm{CH}_{3} \mathrm{COO}^{-} \mathrm{Na}^{+} / \mathrm{CH}_{3} \mathrm{COOH} durante o processo de síntese? Considerando-se o pKa da anilina, discuta qual deve ser o pH do meio reacional:

Passo 1

O enunciado pede duas coisas: (1) qual é a função da mistura \mathrm{CH}_{3}\mathrm{COO}^{-}\mathrm{Na}^{+}/\mathrm{CH}_{3}\mathrm{COOH} durante um processo de síntese e (2) considerando o \mathrm{p}K_a da anilina, discutir qual deve ser o pH do meio reacional. Informações relevantes dadas ou que vamos assumir: a mistura é acetato de sódio + ácido acético (um tampão acético), o \mathrm{p}K_a do ácido acético é aproximadamente \mathrm{p}K_a(\mathrm{AcOH})=4{,}76 e o \mathrm{p}K_a do cátion anilínio (ou seja, \mathrm{p}K_a da anilina protonada) é aproximadamente \mathrm{p}K_a(\text{anilina})\approx 4{,}6. Não há outros dados numéricos no enunciado, então usarei esses valores típicos.

Passo 2

O que faz um tampão (resumo didático): um tampão é uma mistura de um ácido fraco e sua base conjugada que resiste a grandes variações de pH quando pequenas quantidades de ácido ou base são adicionadas. A relação quantitativa é dada pela equação de Henderson–Hasselbalch, que nos permite prever o pH do tampão e escolher proporções ácido/base para um pH desejado.

Passo 3

Apresentando a equação de Henderson–Hasselbalch e explicando cada termo:
\mathrm{pH} = \mathrm{p}K_a(\text{ácido}) + \log\frac{[\text{base conjugada}]}{[\text{ácido}]}áá
Aqui:
  • \mathrm{pH} é o pH do meio,
  • \mathrm{p}K_a(\text{ácido})á é o pKa do ácido do tampão (no nosso caso, do ácido acético),
  • [\text{base conjugada}] é a concentração de \mathrm{CH}_3\mathrm{COO}^-,
  • [\text{ácido}]á é a concentração de \mathrm{CH}_3\mathrm{COOH}.
    Se [\text{base}]=[\text{ácido}]á, então \mathrm{pH}=\mathrm{p}K_a.

Passo 4

Aplicando isso ao tampão acetato:
  • Se eu usar razão molar [\mathrm{CH}_3\mathrm{COO}^-]/[\mathrm{CH}_3\mathrm{COOH}]=1, então
\mathrm{pH} = \mathrm{p}K_a(\mathrm{AcOH}) = 4{,}76.
Isto significa que o tampão acetato estabiliza o pH em torno de 4{,}76 (mais ou menos, dependendo das proporções e força do tampão).

Passo 5

Protonação da anilina — explicação e fórmula para fração protonada: a anilina está em equilíbrio
\mathrm{PhNH}_3^+ \rightleftharpoons \mathrm{PhNH}_2 + \mathrm{H}^+,
e a partir do \mathrm{p}K_a da anilina podemos calcular a fração \alpha da anilina protonada ( \mathrm{PhNH}_3^+) para um dado pH pela fórmula derivada da lei de Henderson–Hasselbalch:
\alpha = \frac{1}{1+10^{\mathrm{pH}-\mathrm{p}K_a(\text{anilina})}}.
Aqui \alpha varia entre 0 (toda desprotonada) e 1 (toda protonada).

Passo 6

Cálculos numéricos ilustrativos (usar \mathrm{p}K_a(\text{anilina})=4{,}6):
  • Para \mathrm{pH}=4{,}76 (tampão 1:1):
\alpha=\frac{1}{1+10^{4{,}76-4{,}6}}=\frac{1}{1+10^{0{,}16}}\approx\frac{1}{1+1{,}45}\approx 0{,}41.
Ou seja, cerca de 41\% da anilina está protonada e 59\% está na forma livre.
  • Para \mathrm{pH}=4{,}0 (meio mais ácido que o \mathrm{p}K_a):
\alpha=\frac{1}{1+10^{4{,}0-4{,}6}}=\frac{1}{1+10^{-0{,}6}}\approx\frac{1}{1+0{,}25}\approx0{,}80.
Ou seja, \sim 80\% protonada.
  • Para \mathrm{pH}=3{,}0 (bem ácido):
\alpha\approx\frac{1}{1+10^{-1{,}6}}\approx0{,}975,
ou seja, \sim97{,}5\% protonada.
  • Para \mathrm{pH}=6{,}0 (meio básico relativo):
\alpha=\frac{1}{1+10^{6{,}0-4{,}6}}=\frac{1}{1+10^{1{,}4}}\approx\frac{1}{1+25}\approx0{,}038,
ou seja, apenas \sim3{,}8\% protonada (praticamente toda na forma livre).
Esses exemplos mostram que pequenas variações de pH em torno de 4- 6 mudam muito a fração protonada.

Passo 7

Interpretação química (por que isso importa para a síntese):
  • A forma livre \mathrm{PhNH}_2 é nucleófila (ativa em reações de acilação, alquilação, formação de bases de Schiff, etc.). Para ter boa reatividade nucleofílica, você normalmente quer a anilina desprotonada (pH acima do \mathrm{p}K_a).
  • A forma protonada \mathrm{PhNH}_3^+ é solúvel em água como sal, não é nucleófila e não reagirá como amina livre; às vezes isso é desejado para proteger a amina da reação ou para controlar solubilidade e evitar reações secundárias (oxidação, policondensação).
  • Além disso, pH muito ácido pode protonar outros reagentes ou gerar espécies reativas indesejadas; pH muito básico pode causar desprotonação de outras funções ou hidrólise.

Passo 8

Qual pH escolher na prática? Recomendações claras e simples:
  • Se o passo da síntese requer que a anilina atue como nucleófilo (quero que reaja pela amina livre): ajuste o pH para acima do \mathrm{p}K_a(\text{anilina}), tipicamente \mathrm{pH}\approx 6{,}0 a 8{,}0. Assim a maior parte estará desprotonada (por exemplo, em \mathrm{pH}=6 \sim4\% está protonada; em \mathrm{pH}=8 praticamente 100\% está livre).
  • Se o objetivo é manter a anilina como sal solúvel ou “inativa” como nucleófilo (por exemplo para evitar reações laterais ou para preparações que exigem anilina protonada), escolha \mathrm{pH} abaixo do \mathrm{p}K_a, por exemplo \mathrm{pH}\approx 3{,}0 4{,}0 para assegurar >\!80\% protonação.
  • Se você usar um tampão acetato 1:1 (acético/acetato), o pH ficará em torno de \mathrm{pH}\approx 4{,}76; com esse pH a anilina estará parcialmente protonada ( \sim 40\% protonada). Isso é útil quando se quer compromisso entre solubilidade em meio aquoso (melhor quando protonada) e alguma disponibilidade de amina livre, ou quando se quer controlar a taxa de reação.
Observação prática importante: para reações que exigem diazotização da anilina (formação de sais diazônio), normalmente é necessário meio fortemente ácido (pH baixo, tipicamente 0 3), portanto um tampão acetato não é suficiente — precisa-se de ácido mineral forte para gerar nitrosonium. Para acilações controladas, tampão ligeiramente ácido pode evitar múltiplas substituições.

Passo 9

Conclusão operacional e conselho de prova (resumindo e prático):
  • Função do par \mathrm{CH}_3\mathrm{COO}^-/\mathrm{CH}_3\mathrm{COOH}: agir como tampão, manter o pH constante próximo a \mathrm{pH}\approx\mathrm{p}K_a(\mathrm{AcOH})=4{,}76, controlando o estado de protonação da anilina e, consequentemente, sua solubilidade e nucleofilicidade. Isso evita variações de pH que poderiam levar a reações laterais ou perda de rendimento.
  • Quanto ao pH ideal: depende do que você quer na síntese. Como referência numérica:
    • Para anilina principalmente protonada: \mathrm{pH}\lesssim 4 (por exemplo 3 4).
    • Para anilina principalmente livre/nucleófila: \mathrm{pH}\gtrsim 6 (por exemplo 6 8).
    • Um tampão acetato 1:1 dá \mathrm{pH}\approx 4{,}76, que resulta em ~ 40\% de anilina protonada — é um compromisso entre solubilidade e reatividade.

Resposta

A mistura \mathrm{CH}_3\mathrm{COO}^-/\mathrm{CH}_3\mathrm{COOH} funciona como tampão que fixa o \mathrm{pH} (em torno de \mathrm{pH}\approx\mathrm{p}K_a(\mathrm{AcOH})=4{,}76), controlando o estado de protonação da anilina e, assim, sua solubilidade e reatividade nucleofílica.
Considerando \mathrm{p}K_a(\text{anilina})\approx 4{,}6: para ter a anilina majoritariamente protonada escolha \mathrm{pH}\lesssim 4 (ex.: 3 4); para tê‑la majoritariamente na forma livre e nucleófila escolha \mathrm{pH}\gtrsim 6 (ex.: 6 8). Um tampão acetato 1:1 ( \mathrm{pH}\approx 4{,}76) dá ~ 40\% protonada, ou seja, estado intermediário.

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