Questão 7.6
a) Defina base e dimensão de espaço vetorial.
b) Mostre que é W=(x, y, z, t) \in \mathbb{R}^{4} \mid x y z t=0 subespaço de \mathbb{R}^{4}.
c) Determine uma base e a dimensão de W .
d) Use o método de Gram-Schmidt para determinar uma base ortogonal de W .

Passo 1

O enunciado pede quatro coisas:
(a) Definir o que é base e o que é dimensão de um espaço vetorial.
(b) Mostrar se o conjunto W=\{(x,y,z,t)\in\mathbb{R}^4 \mid x y z t = 0\} é subespaço de \mathbb{R}^4.
(c) Determinar uma base e a dimensão de W.
(d) Usar o método de Gram–Schmidt para determinar uma base ortogonal de W.
Informações relevantes dadas pelo enunciado:
  • O universo é \mathbb{R}^4.
  • O conjunto W é formado por todos os vetores cujas quatro coordenadas têm produto zero, isto é, vetores em que pelo menos uma coordenada é zero.
  • Não foi dada nenhuma outra restrição nem figura.

Passo 2

Definição didática de base e dimensão (parte (a)).
  • Espaço vetorial: é um conjunto de vetores com operações de soma e multiplicação por escalar que satisfazem os axiomas usuais (associatividade, existência de zero, etc.). Aqui pensamos em \mathbb{R}^4.
  • Sistema gerador (span): um conjunto de vetores \{v_1,\dots,v_k\} gera um subespaço S se qualquer vetor de S pode ser escrito como combinação linear \alpha_1 v_1+\cdots+\alpha_k v_k com escalares \alpha_i.
  • Vetores linearmente independentes: vetores \{v_1,\dots,v_k\} são linearmente independentes se a única solução do sistema \alpha_1 v_1+\cdots+\alpha_k v_k=0 é \alpha_1=\cdots=\alpha_k=0.
  • Base: uma base de um espaço vetorial V é um conjunto de vetores que é ao mesmo tempo gerador de V e linearmente independente. Intuitivamente, é um conjunto mínimo de vetores que consegue “produzir” todo o espaço por combinações lineares, sem redundância.
  • Dimensão: a dimensão de V é o número de vetores de qualquer base de V. Teorema importante: todas as bases de um mesmo espaço vetorial finito têm a mesma quantidade de vetores, então a dimensão é bem definida.
    Exemplo simples: em \mathbb{R}^3 a base canônica \{(1,0,0),(0,1,0),(0,0,1)\} tem 3 vetores, então \dim(\mathbb{R}^3)=3.

Passo 3

Critérios para um subconjunto S\subseteq\mathbb{R}^n ser subespaço (parte (b), preparação).
Um subconjunto S é subespaço de \mathbb{R}^n se e somente se:
  1. O vetor nulo 0 pertence a S.
  2. S é fechado sob adição: se u\in S e v\in S, então u+v\in S.
  3. S é fechado sob multiplicação por escalares: se u\in S e \lambda\in\mathbb{R}, então \lambda u\in S.
Vou usar esses três itens para verificar se W é subespaço.

Passo 4

Verificação das propriedades em W (parte (b), prova).
  1. Vetor zero: o vetor 0=(0,0,0,0) tem produto 0\cdot0\cdot0\cdot0=0, então 0\in W. OK.
  2. Fechamento por escalares: seja v=(x,y,z,t)\in W. Então x y z t=0, isto é, ao menos uma coordenada é zero. Para qualquer \lambda\in\mathbb{R} temos \lambda v=(\lambda x,\lambda y,\lambda z,\lambda t). O produto das coordenadas de \lambda v é (\lambda x)(\lambda y)(\lambda z)(\lambda t)=\lambda^4(x y z t)=\lambda^4\cdot 0=0. Logo \lambda v\in W. Portanto W é fechado sob multiplicação por escalares. OK.
  3. Fechamento por adição: necessário testar se a soma de dois vetores de W permanece em W. Vou procurar um contraexemplo — basta encontrar u\in W e v\in W tais que u+v\notin W.
Escolha os vetores
u=(1,0,1,0),\qquad v=(0,1,0,1).
Ambos estão em W porque
1\cdot 0\cdot 1\cdot 0=0\quad\text{e}\quad 0\cdot 1\cdot 0\cdot 1=0.
Agora some:
u+v=(1,1,1,1).
O produto das coordenadas de u+v é
1\cdot 1\cdot 1\cdot 1 = 1 \neq 0.
Portanto u+v\notin W. Conclusão: W não é fechado sob adição.
Como a propriedade de fechamento por adição falha, W não é um subespaço de \mathbb{R}^4.
Comentário empático rápido: eu sei que o enunciado pediu “mostre que é subespaço”; às vezes exercício veio com pegadinha — aqui a missão é justamente ver que, na verdade, não é subespaço e justificar com um contraexemplo. Dá um suspiro, isso é comum.

Passo 5

Consequência imediata para as partes (c) e (d).
  • Se W não é subespaço vetorial, então não faz sentido falar em "uma base de W" nem em "a dimensão de W" no sentido de espaço vetorial, porque base e dimensão são conceitos de espaços vetoriais (ou de subespaços). Logo não existe uma base de W nem uma dimensão de W enquanto espaço vetorial—essas perguntas são mal-posed dadas como estão.
  • No entanto, é útil e comum, para entendimento, descrever a estrutura de W: W é a união das quatro hipersuperfícies (planos de dimensão 3) dadas por
H_x=\{(0,y,z,t)\},\quad H_y=\{(x,0,z,t)\},\quad H_z=\{(x,y,0,t)\},\quad H_t=\{(x,y,z,0)\}.
Cada H_\ast é um subespaço linear de \mathbb{R}^4 de dimensão 3 (porque é isomorfo a \mathbb{R}^3), e
W = H_x\;\cup\; H_y\;\cup\; H_z\;\cup\; H_t.
Nenhuma dessas hipersuperfícies contém as outras, e a união não é lin. fechada (como vimos).

Passo 6

Bases e dimensões das hipersuperfícies (resposta alternativa útil para (c)).
Cada hipersuperfície H_\ast é um subespaço de dimensão 3; uma base natural (canônica) e a dimensão são:
  • Para H_x=\{(0,y,z,t)\}:
\text{base: }\{(0,1,0,0),\\ (0,0,1,0),\\ (0,0,0,1)\},\qquad \dim(H_x)=3.
  • Para H_y=\{(x,0,z,t)\}:
\text{base: }\{(1,0,0,0),\\ (0,0,1,0),\\ (0,0,0,1)\},\qquad \dim(H_y)=3.
  • Para H_z=\{(x,y,0,t)\}:
\text{base: }\{(1,0,0,0),\\ (0,1,0,0),\\ (0,0,0,1)\},\qquad \dim(H_z)=3.
  • Para H_t=\{(x,y,z,0)\}:
\text{base: }\{(1,0,0,0),\\ (0,1,0,0),\\ (0,0,1,0)\},\qquad \dim(H_t)=3.
Observação útil: qualquer subespaço linear contido em W está contido em pelo menos uma dessas hipersuperfícies, e a dimensão máxima de um subespaço linear dentro de W é 3. Não existe subespaço linear contido em W de dimensão 4 (isto seria \mathbb{R}^4) porque \mathbb{R}^4\not\subset W.

Passo 7

Gram–Schmidt e por que não se aplica a W inteiro (parte (d)).
  • O método de Gram–Schmidt transforma um conjunto de vetores linearmente independentes em um conjunto ortogonal (ou ortonormal) que gera o mesmo subespaço. Para aplicar Gram–Schmidt precisamos trabalhar dentro de um subespaço vetorial (ou no próprio \mathbb{R}^4).
  • Como W não é subespaço, não faz sentido aplicar Gram–Schmidt "em W" para obter uma base ortogonal de W — porque não existe base vetorial de W.
  • Contudo, podemos aplicar Gram–Schmidt em cada hipersuperfície H_x,H_y,H_z,H_t separadamente. Nas escolhas de base canônica que dei no Passo 6, os vetores já são ortogonais entre si (são vetores canônicos com produto interno padrão). Portanto, por exemplo, para H_x a base
\{(0,1,0,0),\\ (0,0,1,0),\\ (0,0,0,1)\}
é já uma base ortogonal (na verdade ortonormal, se dividirmos cada vetor pela sua norma, que aqui é 1). O mesmo vale para as demais hipersuperfícies: as bases canônicas listadas são ortogonais.
Resumo do uso prático do Gram–Schmidt aqui: não há aplicação global sobre W porque W não é subespaço; mas aplicando o processo nas bases canônicas das hipersuperfícies obtemos bases ortogonais imediatas (já ortogonais).

Resposta

(a) Base: conjunto de vetores que gera o espaço e é linearmente independente. Dimensão: número de vetores de uma base do espaço.
(b) W não é subespaço de \mathbb{R}^4. Contraexemplo: u=(1,0,1,0)\in W, v=(0,1,0,1)\in W, mas u+v=(1,1,1,1)\notin W.
(c) Não existe base nem dimensão de W enquanto espaço vetorial, pois W não é subespaço. (Como informação útil: W é a união dos hipersubespaços H_x,H_y,H_z,H_t, cada um com dimensão 3 e bases canônicas dadas no Passo 6.)
(d) Gram–Schmidt não pode ser aplicado ao conjunto W inteiro porque W não é subespaço. Aplicando Gram–Schmidt às bases canônicas de cada hipersuperfície obtém‑se bases ortogonais (as bases canônicas já são ortogonais), por exemplo para H_x: \{(0,1,0,0),(0,0,1,0),(0,0,0,1)\}.

Exercícios relacionados