Discuta as principais diferenças entre a destilação simples e a fracionada e esboce gráficos de temperatura versus volume de destilado para a destilação da acetona e 1-butanol utilizando essas técnicas.

Passo 1

O enunciado pede duas coisas claras: (1) discutir as principais diferenças entre destilação simples e destilação fracionada; (2) esboçar gráficos de temperatura versus volume de destilado para a mistura acetona + 1-butanol, usando cada técnica.
Informações relevantes que temos (e que vou assumir explicitamente para poder explicar e esboçar os gráficos):
  • Componentes: acetona (vou chamar de A) e 1-butanol (vou chamar de B).
  • Pressão: assumimos pressão atmosférica ( 1\,\mathrm{atm}).
  • Pontos de ebulição (valores a 1\,\mathrm{atm}): \mathrm{bp}_A \approx 56{,}05\,^\circ\mathrm{C} e \mathrm{bp}_B \approx 117{,}7\,^\circ\mathrm{C}.
  • Não foi dada composição inicial; para as ilustrações usarei um caso típico (mistura binária completamente miscível, por exemplo x_A=0{,}50 por mol) — sempre explicarei quando fizer uma assunção.
    Nada mais foi pedido (por exemplo, não foi pedida conta com constantes de Antoine), então vou trabalhar com conceitos de equilíbrio vapor-líquido ideal (Lei de Raoult) e ideias qualitativas/semicuantitativas.

Passo 2

Conceitos fundamentais (o “porquê” das curvas): equilíbrio vapor–líquido e Lei de Raoult + Lei de Dalton. Vou explicar passo a passo e mostrar a fórmula que relaciona composição da fase líquida e da fase vapor numa solução ideal binária.
  1. Lei de Raoult para solução binária ideal: se x_A e x_B são frações molares do líquido e P_A^*(T), P_B^*(T) são as pressões de vapor dos líquidos puros à temperatura T, então as pressões parciais são
P_A = x_A\,P_A^*(T),\qquad P_B = x_B\,P_B^*(T).
Aqui x_A+x_B=1. A ideia física: cada componente “aporta” à pressão total sua fração molar multiplicada pela sua pressão de vapor pura.
  1. Lei de Dalton: pressão total do vapor sobre a solução é
P = P_A + P_B = x_A\,P_A^*(T) + x_B\,P_B^*(T).
  1. Composição do vapor: a fração molar de A na fase vapor, y_A, é
y_A = \frac{P_A}{P} = \frac{x_A\,P_A^*(T)}{x_A\,P_A^*(T) + x_B\,P_B^*(T)}.
Isso é importante: a composição do vapor é em geral diferente da composição do líquido. Se P_A^* > P_B^* (isto é, A é mais volátil), então, para uma mesma x_A, teremos y_A > x_A. Logo o vapor fica enriquecido no componente mais volátil.
  1. Definição útil — volatilidade relativa \alpha: uma forma prática de expressar “quem é mais volátil” é
\alpha = \frac{\left(y_A/x_A\right)}{\left(y_B/x_B\right)} \approx \frac{P_A^*(T)}{P_B^*(T)}.
Se \alpha\gg1, a separação é fácil; se \alpha próximo de 1, é difícil.
Comentário prático: quando aquecemos a mistura, a primeira porção de vapor que se forma tem composição y_A obtida acima à temperatura naquele instante; esse vapor condensado (o destilado) será em geral mais rico no componente mais volátil ( A, acetona). Conforme destilamos, x_A no líquido remanescente diminui e a temperatura de ebulição da mistura tende a subir em direção ao \mathrm{bp}_B.

Passo 3

Interpretação para acetona ( A) e 1-butanol ( B): números e consequências
  1. Dados numéricos que usei: \mathrm{bp}_A \approx 56{,}05\,^\circ\mathrm{C} e \mathrm{bp}_B \approx 117{,}7\,^\circ\mathrm{C}. A diferença é grande:
\Delta \mathrm{bp} = 117{,}7 - 56{,}05 \approx 61{,}65\,^\circ\mathrm{C}.
  1. Consequência física: acetona é muito mais volátil que 1-butanol ( P_A^* muito maior que P_B^* a temperaturas intermediárias). Isso implica uma volatilidade relativa \alpha bem acima de 1, o que facilita a separação por destilação.
  2. Consequência prática: com essa diferença grande de pontos de ebulição, até uma destilação simples convencional (sem coluna fracionadora eficiente) consegue uma separação razoável — o destilado inicial será rico em acetona. A destilação fracionada, no entanto, aumentará bastante a pureza do destilado de acetona se for necessário obter acetona praticamente pura.

Passo 4

Diferenças essenciais entre destilação simples e fracionada — explicação didática e com analogia
  1. Ideia central (analogia): imagine separar areia fina ( A) e pedras ( B) por peneira. A destilação simples é como uma peneira grosseira: deixa passar muita areia, mas também algum cascalho fino. A destilação fracionada é como uma série de peneiras cada vez mais finas — cada “plataforma” retém mais o componente menos volátil, deixando o vapor cada vez mais enriquecido no componente volátil.
  2. Destilação simples:
  • Equipamento: balão de ebulição, condensador, coletor; sem coluna fracionadora ou com coluna muito curta.
  • Processo físico: aproxima-se de um único estágio de equilíbrio vapor–líquido entre líquido no balão e vapor que sai. É como uma única aplicação da fórmula de y_A do Passo 2.
  • Resultado: separação moderada; temperatura do termômetro sobe gradualmente enquanto o componente mais volátil é consumido.
  1. Destilação fracionada:
  • Equipamento: coluna fracionadora entre balão e condensador (pode ser coluna de fracionamento com recheio ou pratos), que promove muitas etapas de vaporização-condensação internas (múltiplos equilíbrios).
  • Processo físico: cada “prato” da coluna faz um equilíbrio líquido–vapor; a cada estágio o vapor sai mais enriquecido em A. Isso é equivalente a aplicar várias vezes a fórmula y_A com composições intermediárias (McCabe–Thiele é o método gráfico para quantificar, mas não precisamos desenhá-lo aqui).
  • Resultado: separação muito melhor (maior pureza), e a curva de temperatura tende a exibir platôs bem mais definidos próximos aos pontos de ebulição dos componentes.
  1. Critério prático de escolha: quando \Delta \mathrm{bp} é grande (tipicamente >40\text{–}50\,^\circ\mathrm{C}) destilação simples muitas vezes é suficiente; quando \Delta \mathrm{bp} é pequena ou quando se busca alta pureza, usa-se fracionada.

Passo 5

Como o comportamento térmico se traduz em gráficos T versus volume de destilado (intuição física antes do esboço)
  • Eixo vertical: temperatura (T) em ^\circ\mathrm{C}. Sempre usar o mesmo termômetro; o valor indica a temperatura da cabeça de destilação (vapor próximo ao condensador).
  • Eixo horizontal: volume acumulado do destilado coletado (V_\text{dest}) ou tempo de coleta (usei V_\text{dest}).
  • Interpretação de trechos do gráfico: um “platô” em T próximo a \mathrm{bp}_A indica que o vapor condensado está praticamente dominado por A. Um aumento contínuo de T indica que a composição do líquido remanescente está mudando (enriquecendo em B), fazendo o ponto de ebulição da mistura subir.

Passo 6

Esboço/desenho do gráfico para destilação simples (descrição detalhada, passo a passo)
Assunção ilustrativa: mistura inicial equimolar \,x_A=0{,}50.
  1. Começo da destilação: ao aquecer, a primeira temperatura registrada quando a corrente de vapor sai será próxima, mas tipicamente um pouco acima, do \mathrm{bp}_A (porque a mistura não é puro A, mas o vapor já estará enriquecido em A). Então o gráfico começa perto de 56{,}0\,^\circ\mathrm{C}.
  2. À medida que se coleta acetona preferencialmente, x_A no balão diminui. Como o líquido remanescente fica relativamente mais rico em B, o ponto de ebulição da mistura sobe. No gráfico isso aparece como uma subida contínua e relativamente suave da temperatura. Não aparece um platô limpo; em vez disso, a curva sobe de cerca de \sim56\,^\circ\mathrm{C} em direção a \sim118\,^\circ\mathrm{C}.
  3. No final da coleta, quando a acetona quase acabou, a temperatura se aproxima do \mathrm{bp}_B e então estabiliza perto de \sim117{,}7\,^\circ\mathrm{C} enquanto se destila o butanol (se a aquecimento continuar).
Resumo do formato: curva que inicia baixa (próxima a \mathrm{bp}_A), sobe de modo contínuo sem platôs bem definidos, e termina próxima a \mathrm{bp}_B.

Passo 7

Esboço/desenho do gráfico para destilação fracionada (descrição detalhada, passo a passo)
  1. Início: com a coluna fracionadora funcionando bem e fluxo de vapores/condensado adequado, o vapor que chega ao topo pode estar muito puro em A. Assim o termômetro mostra um platô bem próximo de \mathrm{bp}_A enquanto se destila a fração rica em acetona. No gráfico isso aparece como uma seção horizontal (ou quase horizontal) em T\approx56{,}0\,^\circ\mathrm{C}.
  2. Quando grande parte da acetona já foi removida, o equilíbrio na coluna muda e a temperatura no topo sobe relativamente rápido até que se estabilize numa nova região. Se a separação for ideal (muitas etapas), teremos outro platô próximo de \mathrm{bp}_B enquanto se destila o butanol.
  3. Se a coluna não for perfeita (poucos pratos ou mau refluxo), os platôs serão menos planos e a transição mais inclinada — isso é uma forma de “meio termo” entre simples e ideal fracionada.
Resumo do formato: em fracionada ideal temos dois platôs distintos: primeiro perto de \mathrm{bp}_A, depois (após subida abrupta) outro perto de \mathrm{bp}_B. A porção de volume correspondente a cada platô depende da composição inicial.

Passo 8

Descrição numérica e interpretação final (um exemplo concreto para fixar a intuição)
Tomando como exemplo uma mistura inicial com x_A=0{,}50 por mol:
  • Em destilação simples, o primeiro 10\%\text{–}40\% do volume destilado pode já conter uma grande fração de acetona, mas não será puro; a temperatura vai aumentar gradualmente dentro desse trecho.
  • Em destilação fracionada eficiente, o primeiro lote coletado terá temperatura quase constante em \sim56{,}0\,^\circ\mathrm{C} e será muito mais próximo de acetona pura; quando isso acabar, haverá uma subida relativamente rápida até \sim118\,^\circ\mathrm{C} e um novo platô para o butanol.
Observação experimental útil: se no laboratório você vê temperatura subindo lentamente desde o início sem platô definido, provavelmente não há coluna eficaz (ou a mistura é relativamente fácil de separar mas a taxa de aquecimento/condensação altera o equilíbrio). Se vê um platô bem definido, a fracionadora está funcionando bem e a pureza do destilado naquele platô é alta.

Passo 9

Resumo prático — quando usar qual técnica e dicas rápidas
  • Use destilação simples quando \Delta \mathrm{bp} for grande (como aqui) e a pureza exigida não seja extrema. Vantagem: rápido e simples.
  • Use destilação fracionada quando for preciso alta pureza ou quando \Delta \mathrm{bp} for pequena; a coluna fracionadora aumenta a eficiência (mais “platos”).
  • Dica de operação: controle taxa de aquecimento, observe o platô de temperatura, mantenha refluxo adequado na coluna para melhor separação.

Resposta

Diferenças principais: A destilação simples corresponde a praticamente um único equilíbrio vapor–líquido (apenas uma “etapa”), é mais rápida e separa moderadamente bem quando os pontos de ebulição diferem bastante; a destilação fracionada usa uma coluna que promove muitas etapas de vaporização-condensação (muitos equilíbrios), dando destilados muito mais puros e mostrando, idealmente, platôs de temperatura próximos aos pontos de ebulição de cada componente.
Gráficos T versus V_{\text{dest}} (descrição dos esboços): Para destilação simples — curva que começa próxima de 56{,}0\,^\circ\mathrm{C} e sobe de forma contínua e suave até cerca de 117{,}7\,^\circ\mathrm{C} (sem platôs bem definidos). Para destilação fracionada — curva com um platô inicial em T\approx56{,}0\,^\circ\mathrm{C} enquanto se destila acetona, seguida de subida relativamente rápida e então um segundo platô em T\approx117{,}7\,^\circ\mathrm{C} enquanto se destila 1-butanol.

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