Descreva a diferença entre um semicondutor e um semimetal

Passo 1

Você pediu para eu descrever a diferença entre um semicondutor e um semimetal.
Informações relevantes (o que vamos comparar): tipo de estrutura de bandas (existência de gap ou sobreposição), número de portadores eletrônicos à temperatura T=0 e a T>0, dependência da condutividade com a temperatura, exemplos materiais e implicações experimentais (medidas que distinguem os dois).

Passo 2

Primeiro, vamos entender alguns conceitos básicos de bandas (sem pânico — vou explicar devagar). Em sólidos, os níveis de energia dos elétrons se organizam em bandas. Dois nomes importantes:
\text{banda de valência}ê
é a banda mais alta ocupada por elétrons a T=0, e
\text{banda de condução}çã
é a banda logo acima, que pode receber elétrons livres para condução. O nível de energia que separa ocupação e vazio é o nível de Fermi \,E_F. À temperatura zero, todos os estados com energia E<E_F estão ocupados e os com E>E_F vazios (isso vem da estatística de Fermi–Dirac, mas não precisamos do detalhe agora).

Passo 3

O que é um semicondutor (definição e consequências)?
  • Em um semicondutor perfeito e puro existe um gap de energia entre a banda de valência e a banda de condução: E_g > 0.
Aqui \,E_g é a energia mínima que um elétron precisa ganhar para pular da valência para a condução.
  • Consequência imediata: a concentração intrínseca de portadores (elétrons na condução n e lacunas na valência p) é praticamente zero a T=0. Ou seja, sem aquecer ou sem dopar, não há elétrons livres para conduzir.
  • Aumentando a temperatura, pares elétron-lacuna são gerados termicamente: a concentração intrínseca n_i cresce com T aproximadamente como
n_i=\sqrt{N_c N_v}\,e^{-E_g/(2k_B T)},
onde k_B é a constante de Boltzmann e N_c,N_v são as densidades efetivas de estados na banda de condução e valência (esses N_c,N_v dependem da massa efetiva dos portadores e de T). Isso explica por que, em semicondutores, a condutividade tende a aumentar exponencialmente com a temperatura (mais portadores disponíveis).
  • Exemplos típicos: silício ( \,\text{Si}), germânio ( \,\text{Ge}), arseneto de gálio ( \,\text{GaAs}).

Passo 4

O que é um semimetal (definição e consequências)?
  • Em um semimetal não existe um gap grande e limpo; em vez disso a banda de condução e a banda de valência se tocam ou se sobrepõem ligeiramente. Podemos representar isso por uma sobreposição de energia \Delta (positiva no caso de sobreposição): as bandas têm \text{sobreposição ou toque:}\quad \Delta \gtrsim 0.çã
  • Consequência: mesmo a T=0 existem estados ocupados na banda de condução e estados vazios na banda de valência — isto gera simultaneamente elétrons (em bolsões na banda de condução) e lacunas (em bolsões na valência). Ou seja, há portadores livres já no zero absoluto, embora em número muito menor do que em um metal convencional.
  • O Fermi surface consiste tipicamente em pequenos “bolsões” de elétrons e de lacunas em pontos diferentes do espaço de momentum.
  • Exemplos: bismuto ( \,\text{Bi}), grafite (certas direções), alguns metais de transição e materiais de “Dirac/Weyl” (quando as bandas se tocam em pontos).

Passo 5

Comparação de concentrações de portadores (ordens de grandeza e interpretação)
  • Em metais bons: densidade de elétrons \sim 10^{22}\,\text{cm}^{-3}.
  • Em semimetais: densidade de portadores é muito menor que em metais, tipicamente \sim 10^{16}\text{--}10^{19}\,\text{cm}^{-3} (depende do material). Importante: mesmo a T=0 há portadores.
  • Em semicondutores intrínsecos (por exemplo silício a 300 K): n_i\sim 10^{10}\,\text{cm}^{-3} (ordem de grandeza) — ou seja, muito menos que semimetais a menos que o semicondutor seja aquecido ou dopado.
    Conclusão prática: semimetal tem portadores a T=0; semicondutor puro tem praticamente zero portadores a T=0.

Passo 6

Como isso aparece nas propriedades de transporte? (fórmulas e interpretação)
A condutividade elétrica pode ser escrita de forma simples como
\sigma = n e \mu,
onde n é a densidade de portadores, e a carga do elétron e \mu a mobilidade (que depende da massa efetiva e do tempo de espalhamento). A mobilidade pode ser aproximada por
\mu = \frac{e\tau}{m^*},
com \tau tempo médio entre colisões e m^* a massa efetiva do portador.
Implicações:
  • Semicondutor intrínseco: n cresce fortemente com T (veja n_i no Passo 3), portanto \sigma aumenta com T (comportamento “ativado”).
  • Semimetal: n varia pouco com T porque já existe portador a T=0; a condutividade normalmente diminui com T (como em metais) porque a mobilidade \mu cai com o aumento da dispersão (maior espalhamento térmico).
  • Hall: semicondutor dopado mostra sinal claro (elétrons ou lacunas). Semimetal frequentemente mostra contribuições de ambos (elétrons e lacunas) e o coeficiente de Hall pode ter sinal e magnitude que dependem de temperaturas e campos, tornando a interpretação mais complexa.

Passo 7

Óptica e espectroscopia — outra forma prática de distinguir
  • Semicondutor: existe um limiar claro de absorção para fótons com energia h\nu \gtrsim E_g. A absorção abaixo de E_g é muito fraca (ignorando defeitos e impurezas).
  • Semimetal: por não ter gap, há absorção de baixa energia e transições interbanda que começam praticamente em energies baixas (não existe uma borda bem definida de gap). Técnicas como ARPES (espectroscopia de elétrons) mostram diretamente se há sobreposição de bandas ou um gap.

Passo 8

Aspectos da estrutura de bandas em k-espaço (visualização mental rápida)
  • Semicondutor: existe um ponto no espaço de momentos onde a banda de valência tem seu máximo e um (talvez outro) ponto onde a banda de condução tem seu mínimo; entre eles há uma diferença de energia E_g. Pode ser direct (mesmo k) ou indirect (diferentes k), o que afeta óptica.
  • Semimetal: máximo da valência e mínimo da condução se sobrepõem ou se cruzam — isso gera pequenos bolsões eletrônicos e de lacuna em pontos distintos do k-espaço.

Passo 9

Consequências práticas e tecnológicas (por que isso importa)
  • Semicondutores são a base da eletrônica porque você pode controlar dramaticamente n por dopagem e temperatura; contatos p–n e transistores usam precisamente o fato de existir um gap e de podermos alterar a densidade de portadores.
  • Semimetais têm propriedades úteis em outros contextos: alta sensibilidade magnética (por causa de bolsões de Fermi pequenos), termelétrica (às vezes), e em física de estados topológicos (quando o toque de bandas tem caráter especial — ex.: semimetal de Dirac/Weyl).

Passo 10

Lista prática de como identificar um do outro em laboratório (checklist rápido)
  • Medir \sigma(T): se aumentar fortemente com T (com comportamento ativado) → semicondutor; se diminuir como metal → semimetal/metálico.
  • Medir coeficiente de Hall R_H: sinal único e grande variação com dopagem → semicondutor; co-presença de elétrons e lacunas e valores pequenos/complicados → semimetal.
  • Espectroscopia óptica ou ARPES: procurar gap E_g>0 (semicondutor) ou sobreposição/toque (semimetal).

Resposta

Semicondutor: material com um gap de energia entre valência e condução \,(E_g>0), sem portadores livres em T=0 (portadores aparecem por excitação térmica ou dopagem), condutividade cresce com a temperatura por geração de pares elétron–lacuna; exemplos: \text{Si},\text{Ge},\text{GaAs}.
Semimetal: material em que bandas de valência e condução se tocam ou se sobrepõem ligeiramente (sem gap claro), havendo elétrons e lacunas coexistentes já em T=0 (pequenas densidades de portadores), condutividade tende a mostrar comportamento mais metálico (dependência fraca de T); exemplos: \text{Bi}, grafite, alguns metais/semimetais de Dirac.

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