Escreva a Lei de Fick para o fluxo de massa difusivo. Quando esta lei é válida? 0 coeficiente de difusão de Fick é função de qual(is) variável(eis)?

Passo 1

O enunciado pede três coisas claras:
  1. Escrever a Lei de Fick para o fluxo de massa difusivo.
  2. Dizer quando essa lei é válida (quais hipóteses/condições precisam valer).
  3. Dizer de quais variável(eis) o coeficiente de difusão de Fick depende.
Informações relevantes dadas (implícitas no enunciado):
  • Queremos a forma para o fluxo de massa (não apenas molar), ou seja, cuidado com as grandezas (massa, fração mássica, densidade).
  • É esperado que eu explique o que cada símbolo representa e as limitações da lei.

Passo 2

Definições importantes (para não confundir na hora da fórmula):
  • Massa específica (densidade): \rho (unidade típica \mathrm{kg\,m^{-3}}).
  • Fração mássica da espécie i: Y_i (adimensional, massa da espécie dividido pela massa da mistura).
  • Concentração molar da espécie i: c_i (unidade \mathrm{mol\,m^{-3}}).
  • Fluxo de massa (espécie i) relativo à velocidade média da mistura: \mathbf{j}_i (unidade \mathrm{kg\,m^{-2}s^{-1}}). Esse é o que normalmente chamamos de “fluxo de massa difusivo”.
  • Fluxo molar (espécie i): \mathbf{J}_i (unidade \mathrm{mol\,m^{-2}s^{-1}}).
Por que faço essa distinção? Porque a Lei de Fick tem formas análogas dependendo se você usa concentração molar ( c_i) ou fração mássica ( Y_i). É importante usar a forma correta no exame.

Passo 3

Escrevendo a Lei de Fick na forma mais direta (forma para concentração molar):
\mathbf{J}_i = -D_i\,\nabla c_i
Explicando cada termo:
  • \mathbf{J}_i é o fluxo molar difusivo da espécie i (mol m ^{-2} s ^{-1}).
  • D_i é o coeficiente de difusão (m ^{2} s ^{-1}).
  • \nabla c_i é o gradiente espacial da concentração molar (mol m ^{-4}).
Agora a forma usada com frequência para fluxo de massa relativo à mistura (útil em problemas de transporte de massa em fluidos):
\mathbf{j}_i = -\rho\,D_i\,\nabla Y_i
Explicando:
  • \mathbf{j}_i é o fluxo de massa difusivo da espécie i (kg m ^{-2} s ^{-1}).
  • \rho é a densidade da mistura (kg m ^{-3}).
  • D_i é, novamente, o coeficiente de difusão (m ^{2} s ^{-1}).
  • \nabla Y_i é o gradiente da fração mássica (m ^{-1}).
Observação prática: se a densidade \rho varia pouco ou se você trabalha com concentrações molares, use a primeira forma; se seu balanço é em massa e você usa frações mássicas, use a segunda.

Passo 4

Como a Lei de Fick aparece em problemas de difusão no tempo (conexão com a equação de difusão):
  • Equação de continuidade (sem fontes químicas, só difusão):
\frac{\partial c_i}{\partial t} + \nabla\cdot\mathbf{J}_i = 0.
  • Substituindo \mathbf{J}_i = -D\nabla c_i obtemos (forma geral):
\frac{\partial c_i}{\partial t} = \nabla\cdot\big(D\nabla c_i\big).
  • Se D é constante (independente de posição e concentração), simplifica para a clássica equação de difusão:
\frac{\partial c_i}{\partial t} = D\,\nabla^2 c_i.
Isso mostra a ligação entre a Lei de Fick (relação local fluxo–gradiente) e a evolução temporal da concentração.

Passo 5

Quando a Lei de Fick é válida? (Explique passo a passo)
  • É uma relação fenomelógica linear (fluxo proporcional ao gradiente). Logo ela é uma aproximação válida quando estamos próximos do equilíbrio local — isto é, quando os gradientes não são enormes e a resposta do sistema é aproximadamente linear.
  • Requisitos práticos:
    1. Escala contínua: comprimento característico do problema muito maior que a escala molecular (continuum válido).
    2. Sistema isotrópico e homogêneo localmente (ou, se anisotrópico, o coeficiente deve ser tratado como tensor).
    3. Para a forma simples \mathbf{J}=-D\nabla c com D constante: temperatura e pressão aproximadamente constantes (isotérmico e sem fortes variações que afetem D).
    4. Misturas diluídas (binárias) são o caso mais simples — em misturas multicomponentes aparecem acoplamentos, e a relação fica mais complicada (necessita de coeficientes multicomponentes ou formulação em termos de potenciais químicos).
    5. Ausência de transporte convectivo dominante. Se houver convecção (movimento do fluido), o transporte convectivo deve ser somado ao difusivo; Fick sozinho não descreve o transporte total.
    6. Não considerar efeitos termo-difusivos (efeito Soret) ou difusão induzida por gradientes de campo químico sem correção — nesses casos a lei precisa ser generalizada para gradiente de potencial químico.
  • Em resumo: serve muito bem para problemas de difusão lenta, isoterma, binária e em escala macroscópica; fora disso, use generalizações (coeficientes dependentes de concentração, tensor de difusão, ou expressão em termos do gradiente do potencial químico).

Passo 6

De que depende o coeficiente de difusão D? (resposta detalhada)
  • Temperatura ( T): é a variável que mais afeta D. Em geral D aumenta com T. Para gases, uma dependência típica da teoria de Chapman–Enskog é aproximadamente
D \propto \frac{T^{3/2}}{P\sqrt{M}},
onde P é pressão e M massa molar característica; para líquidos a dependência costuma ser complexa, às vezes de Arrhenius tipo.
  • Pressão ( P): em gases ideais a dependência é \sim 1/P (aumento de pressão diminui D); em líquidos a pressão tem efeito pequeno, mas pode ser relevante em condições extremas.
  • Concentração / composição: em soluções concentradas D pode depender fortemente da concentração da espécie (ex.: difusão em polímeros, soluções não ideais). Portanto D=D\text{(c)} é comum.
  • Natureza do meio: em meios porosos ou heterogêneos aparece um D_{\text{efetivo}} que inclui porosidade \varepsilon e tortuosidade \tau, normalmente D_{\text{efetivo}} = (\varepsilon/\tau)\,D.
  • Propriedades moleculares: tamanho molecular, massa, interações intermoleculares e viscosidade do solvente influenciam D.
  • Anisotropia: em cristais ou meios anisótropos, D é um tensor \mathbf{D}, não um escalar.
  • Em resumo: D é função de \,T,\,P,\,\text{composição},\,\text{propriedades do meio}\,çã e das características moleculares. Em casos simples você pode tratar D como constante; em casos reais é comum ter D=D(c,T,\ldots).

Passo 7

Unidades, ordens de grandeza e dicas para prova
  • Unidade de D: \mathrm{m^{2}\,s^{-1}}.
  • Ordens de grandeza típicas:
    • Gases: D\sim 10^{-5} a 10^{-4}\,\mathrm{m^{2}\,s^{-1}}.
    • Líquidos: D\sim 10^{-9} a 10^{-10}\,\mathrm{m^{2}\,s^{-1}}.
    • Sólidos (difusão atômica): muito menores, depende fortemente da temperatura.
  • Dicas práticas:
    1. Sempre cheque se o enunciado pede fluxo molar ( \mathbf{J}) ou fluxo de massa ( \mathbf{j}). Converta com \mathbf{j}_i = M_i \mathbf{J}_i ou usando fração mássica \mathbf{j}_i = -\rho D\nabla Y_i.
    2. Se tiver variação temporal e D constante, use \partial c/\partial t = D\nabla^2 c. Se D=D\text{(c)}, terá que trabalhar com \partial c/\partial t = \nabla\cdot(D\text{(c)}\nabla c).
    3. Se houver convecção, escreva o termo convectivo e some ao termo difusivo: transporte total = convecção + difusão.

Resposta

\mathbf{j}_i = -\rho\,D_i\,\nabla Y_i \
Válida quando a resposta é linear perto do equilíbrio local: meio contínuo (escala macroscópica), gradientes não muito grandes, sistema isotrópico ou tratado com tensor, caso simples binário/isotérmico sem acoplamentos fortes; se D constante também exige condições aproximadamente isotermais e sem variações fortes de composição. \
D depende de T (fortemente), P (principalmente em gases), composição/concentração, propriedades do meio (porosidade, tortuosidade, anisotropia) e das propriedades moleculares (massa, tamanho, interações); em geral D=D(c,T,P,\text{propriedades do meio},\ldots).

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