Um gás natural, consistindo exclusivamente em metano (
), é queimado com uma corrente de ar enriquecida com oxigênio, cuja composição é
de
e
de
. A análise de Orsat do produto gasoso, conforme reportada pelo laboratório, é
de
,
de
e
de
. A análise reportada pode estar correta? Mostre todos os cálculos.
Passo 1
O enunciado dá as seguintes informações e pede para verificar se a análise do gás de combustão está correta:
- Gás combustível: exclusivamente metano,
. - Gás comburente (corrente de ar enriquecida): composto por
de e de (essas percentagens são em base molar/volumétrica). - Análise Orsat (produto seco, conforme é usual):
de , de e de . - Pergunta: “A análise reportada pode estar correta?” — ou seja, verificar se existe um balanço estequiométrico compatível entre combustível fornecido, comburente e os percentuais secos reportados.
Informações relevantes listadas:
- A análise Orsat reportada soma
(está em base seca). - Para cada mol de
queimado, a estequiometria para combustão completa exige mols de formando mol de (mais água que é removida na análise seca). - Vamos usar moles (volumes) como base e fazer balanços molares secos. Não vou assumir nada além do enunciado (por ex., que a análise é em base seca).
Passo 2
Escolha da base e definição de variáveis (coisa crucial para fazer os balanços sem erro):
- Escolho como base
mol de queimado — é um padrão bem simples e que facilita raciocínio por mol. - Seja
o número de mols (volumes) da corrente de ar enriquecida que entra para queimar esse mol de . Nesse comburente temos: -
mols de , -
mols de .
-
- Primeiro considero a hipótese mais simples: combustão completa (todo carbono vira
, sem ). Depois vamos levantar a possibilidade de para ver se consegue explicar a análise.
Lembrando a estequiometria completa para
:
Então, para 1 mol de
queimado, produzimos
mol de
e consumimos
mols de
.
Passo 3
Balanço dos gases secos no caso de combustão completa (
, onde
seria mols de
caso houvesse):
- Mols de produtos secos (por base 1 mol
): -
: mol (do carbono). -
em excesso: mol (se positivo; se negativo significa falta de O2). -
: mol (inerte, atravessa a reação).
-
- Total de moles secos no produto:
- A fração molar (percentual em base seca) de
então será:
Passo 4
Usando o dado de
para determinar
(caso
):
- Colocando em forma decimal:
. - Logo,
- Calculemos:
Então, se os
de
forem corretos e não houver
, o comburente fornecido por mol de
seria
mols da mistura
.
Passo 5
Com esse
calculado, calculo as frações esperadas de
e
(caso
) e comparo com as dadas:
- Mols de
em excesso:
- Fração molar de
no gás seco:
- Mols de
: . - Fração molar de
:
Comparação com análise reportada:
-
esperado vs reportado → discrepância grande. -
esperado vs reportado → também discrepância.
Portanto, sob hipótese de combustão completa (nenhum
), os percentuais reportados não são compatíveis.
Passo 6
Verificação alternativa: usar o
reportado para determinar
e checar
:
- A equação para
seca é:
- Resolvendo:
- Com
, a fração de prevista (caso ) seria:
o que não bate com os
reportados.
Conclusão dessa verificação: os dados de
e
são incompatíveis entre si sob a hipótese de combustão completa.
Passo 7
Agora considero a possibilidade de combustão parcial com formação de
. Montamos balanços gerais permitindo
mols de
por mol de
(ou seja,
é fração molar de carbono que sai como
):
- Reação geral (por 1 mol
):
- Balanço de oxigênio dá
(derivação rápida: contar átomos de O). - Mols de
disponíveis: . Portanto em excesso é:
- Mols secos no produto (por 1 mol
): -
, -
, -
em excesso: , -
.
-
- Total seco:
- Frações molares secas:
Passo 8
Tentativa de ajustar
e
para coincidir com os valores reportados
,
,
:
- Primeiro combino
e (duas equações) para achar e . Das fórmulas:
com
.
Fazendo os passos algébricos (substituição e limpeza) obtemos (resumo dos cálculos numéricos):
- Solução aproximada:
(ou seja, cerca de do carbono saindo como ) e . - Com esses valores, a fração prevista de
fica:
que difere do valor reportado
.
- Em alternativa, combinar
e e resolver por dá e , mas aí o resultante fica negativo (ou seja, haveria falta de oxigênio — o que contradiz o relatório que mostra residual positivo ). Isso é fisicamente impossível para um relatório que dá O2 positivo.
Resumo desta etapa: admitindo formação de
é possível ajustar dois dos três valores reportados, mas não os três simultaneamente. O sistema de três equações com duas incógnitas (mais a incógnita
) prova ser incompatível com os três percentuais dados — os três percentuais não satisfazem simultaneamente os balanços molares.
Passo 9
Interpretação física e síntese do que os cálculos mostram (em linguagem simples):
- Se assumirmos que todo o carbono virou
(combustão completa), os de implicam em muito mais residual do que o reportado ( esperado vs medido) e menos ( esperado vs medido). Logo não bate. - Se permitirmos
parcial, dá para ajustar dois dos três números (por exemplo e ), mas então o terceiro ( ) fica fora; ou ajustar e e aí o fica fisicamente impossível (negativo). - Portanto não existe combinação de
(quantidade de ar enriquecido) e (fração de C como ) que torne simultaneamente verdadeiros , e para combustão de metano com ar de composição .
Em palavras amigáveis: os números não fecham os balanços molares. Algo no relatório ou na medição está errado (por exemplo: erro na titulação Orsat, erro em descontar a umidade, erro de leitura, ou composição do comburente diferente da informada).
Resposta
Não — a análise reportada não pode estar correta para combustão de
com o comburente
; os percentuais de
,
e
são inconsistentes entre si pelos balanços estequiométricos.