Explique como a lei de Raoult e a lei de Henry são usadas para especificar o potencial químico de um componente de uma mistura.

Passo 1

O que o enunciado pede: explicar como a lei de Raoult e a lei de Henry são usadas para especificar o potencial químico de um componente de uma mistura.
Informações relevantes que temos que usar / entender (explicitadas para não deixar nada subentendido):
  • O potencial químico de uma espécie i é uma grandeza ligada à energia livre por mol dessa espécie na mistura; vamos representá-lo por \mu_i.
  • Em equilíbrio líquido-vapor, a condição é \mu_i^{(\ell)}=\mu_i^{(g)}.
  • A lei de Raoult relaciona a pressão parcial do componente i no gás com a fração molar do componente na fase líquida por p_i = x_i p_i^*, onde p_i^* é a pressão de vapor do líquido puro i.
  • A lei de Henry relaciona, para solutos pouco solúveis (diluição), a pressão parcial com a fração molar por p_i = x_i H_i, onde H_i é a constante de Henry do componente i (depende de temperatura).
  • Precisamos também da expressão termodinâmica que liga \mu_i à pressão/fugacidade/atividade (vai aparecer nas contas).
Não resolvo nada ainda; apenas organizei o que será usado.

Passo 2

O que é o potencial químico e como ele se relaciona com pressão/fugacidade/atividade (a peça central da estratégia).
  • Definição prática: o potencial químico \mu_i é a variação da energia (energia livre de Gibbs) quando se adiciona uma pequena quantidade de i à mistura a T,P constantes. Não precisa decorar a derivada formal agora; o que importa é a fórmula útil abaixo.
  • Relação com fugacidade f_i (uma pressão “efetiva” que generaliza a ideia de pressão para gases não ideais):
\mu_i(T,P,\ldots)=\mu_i^\circ(T)+RT\ln\!\left(\frac{f_i}{p^\circ}\right).
Aqui: \mu_i^\circ(T) é uma referência (potencial químico padrão a uma pressão de referência p^\circ, normalmente 1\\ \text{bar}), R é a constante dos gases e T a temperatura. Explico: tudo que aparece no log deve ser adimensional; por isso dividimos por p^\circ.
  • Relação com atividade a_i: definimos a_i\equiv f_i/p^\circ. Então a fórmula fica mais curta:
\mu_i=\mu_i^\circ+RT\ln a_i.
  • Para soluções, costuma-se escrever a_i=\gamma_i x_i, onde x_i é a fração molar e \gamma_i é o coeficiente de atividade (mede a não-idealidade; \gamma_i=1 se o comportamento for ideal).
Esse é o quadro geral: para obter \mu_i precisamos de uma expressão para a_i (ou f_i ou p_i). As leis de Raoult e de Henry dão precisamente essas expressões em regimes apropriados.

Passo 3

Aplicando a lei de Raoult: contexto, expressão e interpretação física.
  • Quando usar: misturas idealmente misturadas, especialmente para o componente majoritário (solvente) ou quando as interações entre moléculas diferentes são parecidas com as interações entre moléculas iguais. Em provas: Raoult é normalmente usada para o solvente ou para misturas quase ideais.
  • Lei de Raoult (forma prática):
p_i = x_i\,p_i^*,
onde p_i é a pressão parcial do componente i sobre a solução, x_i é a fração molar de i no líquido e p_i^* é a pressão de vapor do líquido puro i à mesma temperatura.
  • Como isto dá o potencial químico: usar a igualdade de potenciais em equilíbrio líquido-vapor e a expressão do gás ideal (ou do gás real aproximado). Para gás ideal a expressão química é:
\mu_i^{(g)}=\mu_i^\circ + RT\ln\!\left(\frac{p_i}{p^\circ}\right).
Em equilíbrio \mu_i^{(\ell)}=\mu_i^{(g)}, então substituímos p_i pela lei de Raoult:
\mu_i^{(\ell)}=\mu_i^\circ + RT\ln\!\left(\frac{x_i p_i^*}{p^\circ}\right).
  • Separando termos, definimos o potencial químico do líquido puro (referência conveniente):
\mu_i^{\text{(líq, puro)}}\equiv \mu_i^\circ + RT\ln\!\left(\frac{p_i^*}{p^\circ}\right).í
Logo obtemos a forma simples e muito usada:
\boxed{\;\mu_i^{(\ell)}=\mu_i^{\text{(líq, puro)}}+RT\ln x_i\;}í
Interpretação: na aproximação de Raoult o comportamento ideal dá a_i=x_i. Isso significa que a variação do potencial químico ao misturar é simplesmente RT\ln x_i em relação ao líquido puro. É uma relação direta, intuitiva e muito prática na prova: basta saber x_i e a referência \mu_i^{\text{(líq, puro)}}í.

Passo 4

Exemplo rápido e intuição física para a fórmula de Raoult (para você fixar o raciocínio).
  • Intuição: quando x_i=1 (líquido puro), \ln x_i=0 e portanto \mu_i^{(\ell)}=\mu_i^{\text{(líq, puro)}}í — coerente. Ao diluir i ( x_i<1) temos \ln x_i<0 e \mu_i^{(\ell)} diminui: a presença de outras moléculas facilita a saída de i (menor energia livre por mol).
  • Pequeno exemplo mental: se x_i=0{,}1, então \ln x_i=\ln 0{,}1\approx -2{,}3026, então \Delta\mu = RT\ln x_i é negativa (muito usada em exercícios qualitativos: “o potencial químico cai muito ao diluir bastante”).

Passo 5

Aplicando a lei de Henry: contexto, expressão e por que precisa de uma convenção de referência diferente.
  • Quando usar: soluto em diluições (pequena fração molar), ou quando a espécie i é minoritária e não obedece à Raoult porque suas interações com o solvente são diferentes das interações soluto–soluto. Henry é a lei linear que descreve a pressão parcial do soluto em função da sua fração molar em baixa concentração.
  • Lei de Henry:
p_i = x_i\,H_i,
onde H_i é a constante de Henry (unidade de pressão) para o soluto i à temperatura dada. Note que H_i costuma ser muito maior que p_i^* para solutos pouco voláteis; depende fortemente de T.
  • Derivação análoga à de Raoult: partir da expressão do gás ideal e usar equilíbrio:
\mu_i^{(\ell)}=\mu_i^\circ + RT\ln\!\left(\frac{p_i}{p^\circ}\right)=\mu_i^\circ + RT\ln\!\left(\frac{x_i H_i}{p^\circ}\right).
  • Podemos reescrever definindo uma referência “à base de Henry”:
\mu_i^{\text{(H)}}\equiv \mu_i^\circ + RT\ln\!\left(\frac{H_i}{p^\circ}\right),
de modo que a expressão fique análoga à de Raoult:
\boxed{\;\mu_i^{(\ell)}=\mu_i^{\text{(H)}}+RT\ln x_i\;}
Observação: aqui a referência \mu_i^{\text{(H)}} não é o líquido puro — é um potencial hipotético associado à constante de Henry; é conveniente quando se trabalha com solutos em diluição.

Passo 6

Como conectar Raoult e Henry no quadro de atividade/coeficiente de atividade (útil na prova quando a solução não é perfeitamente ideal).
  • Fórmula geral (sempre válida em termos de atividade/fugacidade):
\mu_i=\mu_i^\circ+RT\ln a_i = \mu_i^\circ + RT\ln(\gamma_i x_i).
  • Limites:
    • Se a solução é ideal e i é tratado pelo regime de Raoult (geralmente solvente), então \gamma_i\to 1 e a_i=x_i — recuperamos a forma de Raoult.
    • Para soluto diluído, a propriedade experimental é p_i \approx x_i H_i. Colocando isso na expressão do gás ideal e comparando com a forma geral, obtemos que, na vizinhança do zero de concentração, \gamma_i tem um comportamento tal que a_i \to x_i H_i/p^\circ. Em palavras: a constante de Henry estabelece a escala da atividade do soluto em diluição.
  • Em exercícios práticos: se te dão p_i^* use Raoult para componentes que se comportam quase como puros; se te dão H_i e a fração molar é pequena, use Henry. Se te derem coeficientes de atividade \gamma_i, use a expressão geral.

Passo 7

Limitações, dependências e dicas práticas para a prova (o que o professor costuma cobrar).
  • Ambas as leis são aproximações úteis: Raoult para soluções ideais / solvente; Henry para solutos diluídos. Não aplique Raoult para soluto muito pouco volátil nem Henry para componente majoritário.
  • Tanto p_i^* quanto H_i dependem de T; atenção às unidades (normalmente pressão em bar ou Pa). A constante de Henry H_i tem dimensão de pressão; por isso aparece dividida por p^\circ nas fórmulas logarítmicas.
  • Se a questão pede diferença de potencial químico entre duas composições, use diretamente \Delta\mu = RT\ln\!\left(\dfrac{a_i^{(2)}}{a_i^{(1)}}\right) e substitua as atividades pelas formas de Raoult/Henry conforme o caso. Isso facilita cálculos sem ter que manipular \mu^\circ.

Passo 8

Resumo operacional (passos que eu usaria numa prova) — receita de bolo curta para não se enrolar:
  1. Identifico se o componente é solvente (maioria) ou soluto diluído (minoria).
  2. Se for solvente em solução ideal: aplicar Raoult p_i=x_i p_i^* e depois usar \mu_i^{(\ell)}=\mu_i^\circ+RT\ln\!\left(\dfrac{x_i p_i^*}{p^\circ}\right) ou a forma equivalente \mu_i^{(\ell)}=\mu_i^{\text{(líq,puro)}}+RT\ln x_ií.
  3. Se for soluto diluído: aplicar Henry p_i=x_i H_i e obter \mu_i^{(\ell)}=\mu_i^\circ+RT\ln\!\left(\dfrac{x_i H_i}{p^\circ}\right) ou \mu_i^{(\ell)}=\mu_i^{\text{(H)}}+RT\ln x_i.
  4. Se houver não idealidade conhecida, use \mu_i=\mu_i^\circ+RT\ln(\gamma_i x_i).
  5. Em qualquer cálculo numérico, verifique unidades e a temperatura (para R T).

Resposta

\displaystyle \mu_i=\mu_i^\circ+RT\ln a_i, com a_i=\gamma_i x_i.\n\nLei de Raoult (solvente / solução ideal): \displaystyle p_i=x_i p_i^*\Rightarrow \mu_i^{(\ell)}=\mu_i^{\text{(líq,puro)}}+RT\ln x_i.í\n\nLei de Henry (soluto diluído): \displaystyle p_i=x_i H_i\Rightarrow \mu_i^{(\ell)}=\mu_i^\circ+RT\ln\!\left(\dfrac{x_i H_i}{p^\circ}\right)=\mu_i^{\text{(H)}}+RT\ln x_i.

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