Questão 7.8
a) Defina base e dimensão de espaço vetorial.
b) Mostre que é W=(x, y, z, t) \in \mathbb{R}^{4} \mid-x+y+z+2 t=0 subespaço de \mathbb{R}^{4}.
c) Determine uma base e a dimensão de W .
d) Use o método de Gram-Schmidt para determinar uma base ortogonal de W .

Passo 1

O enunciado tem quatro itens. Vou listar claramente o que se pede e os dados fornecidos para não nos perdermos:
  • (a) Definir o que é base e o que é dimensão de um espaço vetorial.
  • (b) Mostrar que o conjunto W=\{(x,y,z,t)\in\mathbb{R}^{4}\mid -x+y+z+2t=0\} é um subespaço de \mathbb{R}^{4}.
  • (c) Determinar uma base de W e a dimensão de W.
  • (d) Aplicar o método de Gram–Schmidt para obter uma base ortogonal de W.
Informações dadas:
W=\{(x,y,z,t)\in\mathbb{R}^{4}\mid -x+y+z+2t=0\}.
A partir daqui eu começo a resolver cada item passo a passo.

Passo 2

(a) Definições (explicadas de forma didática)
  • Base: Uma coleção de vetores \{v_1,\dots,v_k\} de um espaço vetorial V é chamada de base se duas condições são satisfeitas:
    1. Geram V: todo vetor v\in V pode ser escrito como combinação linear
    v = a_1 v_1 + a_2 v_2 + \cdots + a_k v_k
    para alguns escalares a_i.
    2. São linearmente independentes: a única combinação linear que dá o vetor zero é a combinação trivial, isto é, se
    c_1 v_1 + c_2 v_2 + \cdots + c_k v_k = 0
    então todos os c_i são zero.
    Intuição: a base é um conjunto “mínimo” que consegue gerar todo o espaço, sem redundância.
  • Dimensão: A dimensão de um espaço vetorial V é o número de vetores em qualquer base de V. Ou seja, se existe uma base com k vetores, então \dim V = k. Teorema importante: todas as bases de um espaço vetorial têm o mesmo número de vetores.
Exemplo rápido e concreto: em \mathbb{R}^3 a base usual é \{(1,0,0),(0,1,0),(0,0,1)\} e \dim\mathbb{R}^3=3.

Passo 3

(b) Mostrar que W é subespaço de \mathbb{R}^4.
Para provar que um subconjunto W\subseteq\mathbb{R}^4 é subespaço basta mostrar três coisas:
  1. O vetor zero pertence a W.
  2. W é fechado sob soma: se u,v\in W então u+v\in W.
  3. W é fechado sob multiplicação escalar: se u\in W e \lambda\in\mathbb{R} então \lambda u\in W.
Aplicando ao nosso W:
  1. Vetor zero: (0,0,0,0) satisfaz -0+0+0+2\cdot 0=0. Logo (0,0,0,0)\in W.
  2. Fechamento por soma: sejam u=(x_1,y_1,z_1,t_1)\in W e v=(x_2,y_2,z_2,t_2)\in W. Então
- x_1 + y_1 + z_1 + 2 t_1 = 0,\qquad - x_2 + y_2 + z_2 + 2 t_2 = 0.
Somando as duas igualdades:
-(x_1+x_2) + (y_1+y_2) + (z_1+z_2) + 2(t_1+t_2) = 0,
ou seja u+v satisfaz a equação que define W. Logo u+v\in W.
  1. Fechamento por escalar: seja \lambda\in\mathbb{R} e u=(x,y,z,t)\in W. Como -x+y+z+2t=0, multiplicando por \lambda obtemos
-(\lambda x) + (\lambda y) + (\lambda z) + 2(\lambda t) = \lambda(-x+y+z+2t) = 0,
ou seja \lambda u \in W.
Como os três itens valem, W é subespaço de \mathbb{R}^4.

Passo 4

(c) Determinar uma base de W e a dimensão de W.
Vamos parametrizar os vetores de W. A condição é
-x+y+z+2t=0.
Isolando x em função de y,z,t:
x = y+z+2t.
Então um vetor geral de W tem a forma
(x,y,z,t) = (y+z+2t,\; y,\; z,\; t).
Agora escrevemos isso como combinação linear dos parâmetros y,z,t:
(y+z+2t,\; y,\; z,\; t) = y\,(1,1,0,0) + z\,(1,0,1,0) + t\,(2,0,0,1).
Assim todo vetor de W é combinação linear dos vetores
v_1 = (1,1,0,0),\qquad v_2 = (1,0,1,0),\qquad v_3 = (2,0,0,1).
Portanto W=\text{span}\{v_1,v_2,v_3\}.
Agora precisamos verificar que \{v_1,v_2,v_3\} é linearmente independente (ou, se houver dependência, extrair uma base independente). Vamos checar independência:
Suponha que existam escalares a,b,c tais que
a v_1 + b v_2 + c v_3 = 0.
Escrevendo coordenada a coordenada:
a(1) + b(1) + c(2) = 0 \quad\text{(coordenada }x\text{)},
a(1) + b(0) + c(0) = 0 \quad\text{(coordenada }y\text{)},
a(0) + b(1) + c(0) = 0 \quad\text{(coordenada }z\text{)},
a(0) + b(0) + c(1) = 0 \quad\text{(coordenada }t\text{)}.
Da coordenada t vem c=0. Da coordenada z vem b=0. Da coordenada y vem a=0. Logo a=b=c=0. Portanto os vetores são linearmente independentes.
Conclusão: \{v_1,v_2,v_3\} é uma base de W. Logo
\dim W = 3.
Comentário intuitivo: a equação linear única impõe uma restrição a \mathbb{R}^4, por isso esperávamos dimensão 4-1=3.

Passo 5

(d) Método de Gram–Schmidt e aplicação para obter uma base ortogonal de W.
Primeiro, o que é Gram–Schmidt? É um procedimento que pega uma base qualquer \{v_1,\dots,v_k\} de um subespaço de \mathbb{R}^n e constrói uma base ortogonal \{u_1,\dots,u_k\} do mesmo subespaço. A fórmula central usa projeções com o produto interno padrão (produto escalar) em \mathbb{R}^n:
\text{proj}_{u}(v) = \frac{\langle v,u\rangle}{\langle u,u\rangle}\, u,
onde \langle a,b\rangle = a_1 b_1 + a_2 b_2 + \cdots + a_n b_n.
O algoritmo (passo a passo):
  1. Tomar u_1 = v_1.
  2. Definir
u_2 = v_2 - \text{proj}_{u_1}(v_2).
  1. Definir
u_3 = v_3 - \text{proj}_{u_1}(v_3) - \text{proj}_{u_2}(v_3).
(Se tivéssemos mais vetores, continuaríamos análogamente.)
Vou aplicar isto aos vetores que já encontramos:
v_1=(1,1,0,0),\quad v_2=(1,0,1,0),\quad v_3=(2,0,0,1).
Calculemos passo a passo (produto interno é a soma dos produtos coordenada a coordenada).
  1. u_1 = v_1 = (1,1,0,0).
Calcule \langle u_1,u_1\rangle:
\langle u_1,u_1\rangle = 1^2+1^2+0^2+0^2 = 2.
  1. Projeção de v_2 sobre u_1:
\langle v_2,u_1\rangle = 1\cdot 1 + 0\cdot 1 + 1\cdot 0 + 0\cdot 0 = 1.
\text{proj}_{u_1}(v_2) = \frac{\langle v_2,u_1\rangle}{\langle u_1,u_1\rangle}\, u_1 = \frac{1}{2}\,(1,1,0,0) = \Big(\tfrac{1}{2},\tfrac{1}{2},0,0\Big).
Logo
u_2 = v_2 - \text{proj}_{u_1}(v_2) = \Big(1,\;0,\;1,\;0\Big) - \Big(\tfrac{1}{2},\tfrac{1}{2},0,0\Big) = \Big(\tfrac{1}{2},\;-\tfrac{1}{2},\;1,\;0\Big).
Para simplificar a escrita e evitar frações, podemos multiplicar u_2 por 2 — isto não altera ortogonalidade nem o espaço gerado — e definir
\tilde u_2 = 2 u_2 = (1,-1,2,0).
Note que \tilde u_2 é ortogonal a u_1, pois escalares não afetam ortogonalidade:
\langle u_1,\tilde u_2\rangle = 1\cdot 1 + 1\cdot(-1) + 0\cdot 2 + 0\cdot 0 = 0.
  1. Agora u_3. Primeiro calculemos projeções de v_3 em u_1 e \tilde u_2.
\langle v_3,u_1\rangle = 2\cdot 1 + 0\cdot 1 + 0\cdot 0 + 1\cdot 0 = 2.
Como \langle u_1,u_1\rangle = 2, temos
\text{proj}_{u_1}(v_3) = \frac{2}{2}\,u_1 = 1\cdot (1,1,0,0) = (1,1,0,0).
Agora com \tilde u_2=(1,-1,2,0):
\langle v_3,\tilde u_2\rangle = 2\cdot 1 + 0\cdot (-1) + 0\cdot 2 + 1\cdot 0 = 2.
\langle \tilde u_2,\tilde u_2\rangle = 1^2 + (-1)^2 + 2^2 + 0^2 = 1+1+4 = 6.
Portanto
\text{proj}_{\tilde u_2}(v_3) = \frac{2}{6}\,\tilde u_2 = \frac{1}{3}\,(1,-1,2,0) = \Big(\tfrac{1}{3},-\tfrac{1}{3},\tfrac{2}{3},0\Big).
Agora
u_3 = v_3 - \text{proj}_{u_1}(v_3) - \text{proj}_{\tilde u_2}(v_3).
Substituindo:
u_3 = (2,0,0,1) - (1,1,0,0) - \Big(\tfrac{1}{3},-\tfrac{1}{3},\tfrac{2}{3},0\Big).
Calculemos coordenada a coordenada:
u_3 = \Big(2-1-\tfrac{1}{3},\; 0-1+\tfrac{1}{3},\; 0-0-\tfrac{2}{3},\; 1-0-0\Big) = \Big(\tfrac{2}{3},\; -\tfrac{2}{3},\; -\tfrac{2}{3},\; 1\Big).
Novamente, para evitar frações multiplicamos u_3 por 3 (não altera ortogonalidade nem a geração do espaço) e definimos
\tilde u_3 = 3 u_3 = (2,-2,-2,3).
Verificações rápidas:
  • \tilde u_3 é ortogonal a u_1: \langle u_1,\tilde u_3\rangle = 1\cdot 2 + 1\cdot(-2) + 0\cdot(-2) + 0\cdot 3 = 0.
  • \tilde u_3 é ortogonal a \tilde u_2: \langle \tilde u_2,\tilde u_3\rangle = 1\cdot 2 + (-1)\cdot(-2) + 2\cdot(-2) + 0\cdot 3 = 2+2-4+0=0.
Também é bom checar que cada \tilde u_i realmente pertence a W (deveria, já que são combinações lineares dos v_i que estão em W):
  • Para u_1=(1,1,0,0): -1+1+0+0=0.
  • Para \tilde u_2=(1,-1,2,0): -1+(-1)+2+0=0.
  • Para \tilde u_3=(2,-2,-2,3): -2+(-2)+(-2)+2\cdot 3 = -6 +6=0.
Portanto uma base ortogonal de W é, por exemplo,
\{\,u_1,\;\tilde u_2,\;\tilde u_3\,\} = \{\, (1,1,0,0),\; (1,-1,2,0),\; (2,-2,-2,3)\,\}.
Se quiser uma base ortonormal, basta normalizar cada vetor dividindo pelo seu comprimento (norma), mas o enunciado pediu base ortogonal, então não é necessário normalizar.

Resposta

(a) Uma base de um espaço vetorial V é um conjunto de vetores que gera V e é linearmente independente. A dimensão de V é o número de vetores em qualquer base de V.
(b) W é subespaço de \mathbb{R}^4 (contém o vetor zero, é fechado sob soma e multiplicação escalar).
(c) Uma base de W é
\{(1,1,0,0),\; (1,0,1,0),\; (2,0,0,1)\},
e \dim W = 3.
(d) Uma base ortogonal de W obtida por Gram–Schmidt é
\{(1,1,0,0),\; (1,-1,2,0),\; (2,-2,-2,3)\}.

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