Método dos Parâmetros Concentrados
Teoria
Introdução
A gente já estudou muitas coisas, mas todas tinham algo em comum: a gente sempre assumia que o estado era estacionário. Sendo assim, as propriedades não mudavam ao longo do tempo.
Mas imagina que você pegue um corpo que está dentro do forno a uma temperatura alta e a coloque em uma piscina com água bem gelada . Se a gente acompanhar a temperatura desse corpo, ela vai diminuir ao longo do tempo.
Logo que a gente coloca o corpo ali dentro, existe um gradiente de temperatura entre ele e o fluido, gerando um fluxo de calor. Sendo assim, o corpo perde energia. Ao perder essa energia, sua temperatura diminui. E isso acontece até a temperatura do corpo se igualar à do fluido.
Esse é um caso típico de um problema em que uma propriedade (a temperatura) varia no tempo. A isso chamamos de regime transiente!
No caso do regime estacionário, a gente conseguiu várias expressões analíticas para descrever o perfil de temperatura na parede plana, na esfera, no cilindro... Mas com o regime transiente não é tão fácil, as soluções analíticas são bem mais raras!
Mas o que é o método dos parâmetros concentrados?
Pois bem, o método dos parâmetros concentrados é uma das poucas soluções analíticas que a gente pode conseguir. Mas, como nada é de graça, pra usar esse método a gente adota uma simplificação:
“A condutividade do material () deve ser considerada infinita, para que a temperatura do sólido seja constante a cada instante de tempo.”
Não existem materiais com condutividade térmica () infinita. Mas, se a resistência de condução no interior do sólido for muito pequena quando comparada a resistência de convecção , aí a gente pode assumir que a condutividade térmica é “infinita”. Ou seja:
Dividindo os dois lados da inequação por , a gente fica com:
Para o caso da parede plana, a gente pode substituir as expressões das resistências:
Reorganizando a inequação:
Pronto! Agora tá mais tranquilo de ver como a gente define, na prática, se essa aproximação é válida. Com os valores de , e conhecidos, a gente calcula essa razão e verifica se o valor é muito menor do que .
Só que essa razão é tão importante que recebe uma nomenclatura especial, esse é o que chamamos do número de Biot ():
Mas você pode estar pensando: “Se esse número der já tá bom? Ou ele tem que ser pra eu considerar que é muito menor do que ?”
É uma ótima pergunta! Muitos experimentos foram feitos e observaram que a simplificação já é válida se:
Então, se der você não pode usar esse método dos parâmetros concentrados, mas se der já pode!
A gente só vai usar esse método pra parede plana?
Ótima pergunta, pequeno gafanhoto! E a resposta é “não”! A gente pode usar pra esferas e cilindros também usando o mesmo cálculo do número de Biot ().
Só que o comprimento vai virar um comprimento característico e ele pode ser definido de duas formas:
- Razão entre o volume e a área superficial do sólido.
- Comprimento correspondente à maior diferença de temperatura no sólido.
Pra calcular pela primeira definição, basta saber como calcular os volumes e áreas, mas pra usar a segunda definição, você tem que prever onde seria o ponto mais quente e onde seria o ponto mais frio no sólido e encontrar essa distância.
Mas fica tranquilo, que eu já coloquei tudo bonitinho aqui pra você! Dá uma olhada:
Tudo muito bonito, mas como fazer os exercícios?
Isso aí! Pra isso, nada melhor que um exemplo! Você se lembra daquele corpo tava quente () e você imergiu num fluido frio (). Bora falar dele então!
Como tudo em Transferência de Calor, bora fazer um balanço de energia nesse corpo:
Como não tem nenhuma energia entrando e o corpo não gera calor por si só, a gente fica com:
A taxa de calor de saída () é uma taxa de convecção, então a gente sabe como escrever sua expressão. E a taxa de acúmulo () a gente já viu como pode escrever também:
Em que é a temperatura do corpo num dado instante e vale no início ().
Vamos fazer aquela mudança de variável para a temperatura de excesso ():
Essa é a equação que a gente tem pra resolver! Existem basicamente dois casos de problemas envolvendo o regime transiente:
Caso A: A gente sabe qual a temperatura final do corpo e queremos saber quanto tempo é necessário pra que essa temperatura seja alcançada. (Variável de interesse: )
Caso B: A gente sabe quanto tempo o corpo vai ficar exposto ao fluido e quer saber sua temperatura final. (Variável de interesse: )
Então a gente pode resolver a equação de duas maneiras, uma para cada caso:
Caso A: Solução para o tempo.
Integrando em ambos os lados:
Caso B: Solução para a temperatura.
Aplicando a exponencial em ambos os lados e isolando o termo , a gente fica com:
Podemos escrever mais suscintamente a expressão como:
Em que, a constante de tempo () é dada por:
OBS: Nessa solução, a gente pode ainda reorganizar os termos dentro do expoente e verificar a presença de dois números adimensionais importantes: o número de Biot () e o número de Fourier ().
Em que:
Como calcular a quantidade de calor trocada?
Além de saber a temperatura ou o tempo, às vezes a gente tá interessado em saber a quantidade de energia total que foi transferida (). Pra isso, basta a gente integrar a taxa de calor ao longo do tempo:
Substituindo a expressão da temperatura de excesso que encontramos:
Integrando a expressão:
Prontinho! Agora você já tá preparado pra enfrentar os desafios do regime transiente com o método da capacidade concentrada!
A gente só vai usar esse método pra parede plana?
Tudo muito bonito, mas como fazer os exercícios?
Como calcular a quantidade de calor trocada?
Exercícios Resolvidos
Exercício Resolvido #1
INCROPERA, F. P, DEWITT, D. P. Fundamentos de Transferência de Calor e Massa. 5ed.
Um armazenamento de energia térmica consiste em um grande canal retangular no qual é bem isolado em sua superfície externa e engloba camadas alternadas de material de armazenagem e canal de escoamento.
Cada camada do material de armazenamento é uma placa de alumínio () de largura , a qual está a uma temperatura de . Considere condições para as quais a unidade de armazenamento é carregada pela passagem de um gás quente através dos canais. A temperatura do gás e o coeficiente de convecção são considerados valores constantes de e em todo o canal.
Quanto tempo irá levar para atingir da energia armazenada máxima possível?
Qual será a temperatura do alumínio nesse instante?
Passo 1
Quanto tempo irá levar para atingir da energia armazenada máxima possível?
A gente pode encarar o problema como sendo várias paredes planas, tais que:
Dessa maneira, a gente precisa calcular o número de Biot do bloco pra verificar a validade da aproximação do método dos parâmetros concentrados ().
Para o caso das paredes planas, o comprimento característico () é exatamente a metade da largura da parede (), então:
Substituindo os valores:
Como , a gente pode usar o método dos parâmetros concentrados!
Passo 2
O enunciado nos pede qual é o tempo () pra que a quantidade de energia armazenada atinja da quantidade máxima de calor (). A gente pode escrever da seguinte maneira:
A gente sabe que a quantidade de calor na situação do corpo sob convecção somente depende do tempo e é dada por:
Vamos entender então o que acontece em diferentes momentos:
No instante inicial, a transferência de calor ainda não começou, logo a quantidade de calor trocado será igual a zero, como podemos ver substituindo na equação:
Daí pra frente, quanto maior o valor de , menor será o valor da exponencial e consequentemente maior será a quantidade de energia trocada. Sendo assim, o máximo de calor trocado é atingido quando o tempo tender ao infinito:
Substituindo na equação:
Assim:
Em que:
Logo:
Isso significa aproximadamente .
Passo 3
Qual será a temperatura do alumínio nesse instante?
Agora estamos num problema do caso B, em que já sabemos o tempo () e precisamos determinar a temperatura do corpo! Sendo assim, a gente tem que:
Substituindo os valores que encontramos e já sabemos do enunciado:
Logo:
E, lembrando da definição da temperatura de excesso, a temperatura da esfera nesse instante será:
Resposta
Exercício Resolvido #2
INCROPERA, F. P, DEWITT, D. P. Fundamentos de Transferência de Calor e Massa. 5ed.
Uma esfera sólida de aço () de de diâmetro é revestida com uma camada de material dielétrico de espessura e condutividade térmica . A esfera revestida está inicialmente a uma temperatura de e é subitamente resfriada em um grande banho de óleo, o qual se encontra a e . Estime o tempo necessário para que a temperatura da esfera revestida atinja .
Dica: despreze o efeito do armazenamento de energia no material dielétrico, uma vez que sua capacidade térmica () é pequena quando comparada com a da esfera de aço.
Passo 1
Esse é exatamente pra gente exercitar e ver se entendemos tudo certinho! Bora lá!
A situação proposta pelo enunciado pode ser esquematizada da seguinte forma:
Bom, então a gente tem que calcular quanto tempo leva pra esfera atingir . Como é um problema transiente, a gente pode verificar se dá pra usar o método dos parâmetros concentrados
Então, bora calcular o número de Biot desse problema:
Mas aqui a gente não tem só a esfera, tem também um revestimento que a gente precisa contabilizar! Mas tem uma forma da gente simplificar isso, dá uma olhada!
A gente sabe que uma esfera aquecida sem isolamento vai perder calor para o fluido e essa transferência está associada à resistência de convecção do meio. Se colocarmos um revestimento, essa resistência à transferência aumenta e passa a ser:
Substituindo as expressões da resistência convectiva e condutiva na esfera:
Mas por que estamos fazendo isso? Porque a gente precisa de uma expressão para o coeficiente de convecção () pra calcular o , mas não podemos usar o direto, porque temos que levar em consideração a resistência do revestimento.
Agora que a gente já sabe a resistência, podemos propor um coeficiente global de transferência (), que contabiliza os dois efeitos (condução e convecção) da seguinte forma:
Dividindo pela área da esfera, a gente fica com o coeficiente global:
A gente deve calcular o com esse valor!
Passo 2
Além disso, o comprimento característico () pode ser calculado de duas maneiras:
- Razão entre o volume do sólido e a área superficial do sólido.
- Comprimento correspondente à maior diferença de temperatura no sólido.
Bora ver quanto dá cada um deles. Pela razão entre volume e área da esfera, a gente fica com:
Pela distância que corresponde a maior diferença de temperatura, a gente tem que:
Como o fica menor usando a primeira opção, bora usar ele, porque assim fica mais fácil da aproximação do método dos parâmetros concentrados valer ^^
Assim:
Como , a gente pode usar o método dos parâmetros concentrados! Então, vamos aos cálculos!
Passo 3
O enunciado é um exemplo do caso A, então temos que:
Podemos escrever de outra forma:
Substituindo os valores do enunciado:
Isso equivale a aproximadamente !
Resposta
Exercício Resolvido #3
INCROPERA, F. P, DEWITT, D. P. Fundamentos de Transferência de Calor e Massa. 6ed.
Eixos de aço carbono (AISI 1010) com de diâmetro são tratados termicamente pelo aquecimento em fornalhas a gás onde os gases se encontram a e mantêm um coeficiente convectivo de .
Se os eixos entram no forno a , quanto tempo eles devem permanecer no interior da fornalha para suas linhas de centro atingirem a temperatura de ?
Dados: , , , .
Passo 1
A primeira coisa que temos que fazer aqui é calcular o número de Biot pra saber se podemos usar o Método dos Parâmetros Concentrados pra resolver o problema.
Para cilindros, de acordo com a tabela na Teoria deste tópico, , logo:
Onde:
Substituindo os valores:
Opa! Então está de boassa usar o Método dos Parâmetros Concentrados.
Passo 2
Pelo Método dos Parâmetros Concentrados nós temos que:
Agora é só reorganizar a equação pra isolar o tempo :
Onde:
Substituindo os valores: